Roteiro Homilético 12: Ordem do Carmo Portugual
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De há muito que
seguimos Jesus no seu caminho para Jerusalém. No seu caminho, que é o nosso
itinerário ou currículo de formação. É por isso que devemos pôr toda a atenção
em tudo o que se passa. No episódio do Evangelho proclamado no Domingo passado
(27º do Tempo Comum), Lucas 17,5-10, fomos nós que pedimos a Jesus: «Aumenta a
nossa fé!» (Lucas 17,5). E Ele foi ao campo buscar a metáfora da semente
pequenina e do serviço humilde e dedicado do servo que serve em tudo e sempre o
seu Senhor.
No seguimento
imediato, o Evangelho proclamado neste Domingo 28º do Tempo Comum, Lucas
17,11-19, continua a glosar a temática da fé, e põe diante de nós dez leprosos
que empregam todas as suas forças para, com voz grande, se fazerem ouvir por
Jesus. É a Jesus que dirigem o seu pedido, nestes termos: «Jesus, Mestre,
Faz-nos Graça!» (Lucas 17,13). Aquele «Faz-nos Graça!» soa, no texto grego,
eléêson hêmãs, cujo eco ainda hoje ressoa no nosso «Kýrie, eléêson» («Senhor,
Faz Graça»). «Fazer Graça» é um dizer muito bíblico, que o pensamento ocidental
desconhece, com que nós pedimos a Deus que, como uma mãe cheia de ternura, nos
embale nos seus braços e olhe para nós com o seu olhar carregado de bondade
maternal. Note-se, porém, que esta relação maternal, carinhosa e gratuita, não
assenta em nenhum determinismo. Não é movida pelos laços do sangue ou beleza
atraente ou simpatia, mas é devida a todos, até aos inimigos e àqueles com quem
não simpatizamos e excluimos das nossas relações.
Note-se que os
leprosos, devido à sua doença contagiosa, eram excluídos da sociedade,
literalmente excomungados, e obrigados a andar longe dos povoados, não se
podendo aproximar de ninguém. E, à vista de alguém, deviam gritar: «Impuro,
impuro!», para que as pessoas se desviassem deles, de acordo com as prescrições
que podemos ver no Livro do Levítico 13,45-46.
Jesus escuta o
seu pedido, e manda que se vão apresentar aos sacerdotes, para que estes,
dentro das suas competências (Levítico 13,2-3), os pudessem declarar curados da
lepra. Eles partem, sinal da plena confiança que depositam em Jesus, pois,
quando se pôem a caminho, ainda continuam possuídos pela lepra. Na verdade, é
depois de partirem, enquanto caminham, que se sentem curados! (Lucas 17,14).
O centro do
episódio começa agora. Os holofotes do narrador põem em grande destaque um dos
dez leprosos que, sentindo-se curado, interrompeu a sua viagem e voltou para
trás, louvando a Deus com voz grande, e veio agradecer a Jesus, prostrando-se
aos seus pés! O narrador informa-nos que era um samaritano (Lucas 17,15-16),
portanto herético, estrangeiro, excluído, da região «daquele estúpido povo que
habita em Siquém», para o dizer com as palavras de Ben-Sirá 50,26.
Jesus louva a
fé deste excluído, e deixa entender que a fé não consiste simplesmente em
cumprir ordens, mas também em proclamar a boa nova da salvação, em reconhecer a
graça recebida diante daquele que a concedeu, com uma voz tão grande como o
grito com que antes se lha pediu. Esta voz nova de louvor e de alegria precede
mesmo o cumprimento dos ritos de purificação, precede qualquer rito, interrompe
qualquer viagem, passa à frente de qualquer negócio. É já a segunda vez que
Lucas nos mostra um samaritano a interromper a sua viagem. A primeira vez é
naquela estrada que descia de Jerusalém para Jericó, quando um samaritano se
debruça por amor sobre um homem meio morto (cf. Lucas 10,33-34). O viajante
mesmo é Jesus. O seu discípulo, atento e sensível, segue o Mestre, e, ao seguir
o Mestre, corta estradas velhas, abre estradas novas! Parte sempre de Jesus,
chega sempre a Jesus, princípio e meta de todo o seu caminhar.
António Couto
Palavra para o
caminho
Foi somente o
samaritano que “percebeu” a ação de Deus nele. Com certeza, o termo “percebeu”
não se refere somente à cura física: ele percebeu a presença da salvação de
Deus em Jesus. O ter voltado depois da cura até Jesus significa a sua
conversão.
Em geral, os
comentadores interpretam a reação deste leproso curado sob a forma de
agradecimento: os nove são uns desagradecidos; só o que voltou sabe agradecer.
Certamente é o que parece sugerir o relato. No entanto, Jesus não fala de
agradecimento. Diz que o samaritano voltou «para dar glória a Deus». E dar
glória a Deus é muito mais do que dizer obrigado.
Dentro da
pequena história de cada pessoa, colocada à prova por doenças, enfermidades e
aflições, a cura é uma experiência privilegiada para dar glória a Deus como
Salvador do nosso ser. Assim diz uma célebre fórmula de São Irineu de Leão: «O
que a Deus lhe dá glória é um homem cheio de vida». Esse corpo curado do
leproso é um corpo que canta a glória de Deus.