Tema do 28º
Domingo do Tempo Comum
A liturgia
deste domingo mostra-nos, com exemplos concretos, como Deus tem um projecto de
salvação para oferecer a todos os homens, sem excepção; reconhecer o dom de
Deus, acolhê-lo com amor e gratidão, é a condição para vencer a alienação, o
sofrimento, o afastamento de Deus e dos irmãos e chegar à vida plena.
A primeira
leitura apresenta-nos a história de um leproso (o sírio Naamã). O episódio
revela que só Jahwéh oferece ao homem a vida e a salvação, sem limites nem
excepções; ao homem resta acolher o dom de Deus, reconhecê-l’O como o único
salvador e manifestar-Lhe gratidão.
O Evangelho
apresenta-nos um grupo de leprosos que se encontram com Jesus e que através de
Jesus descobrem a misericórdia e o amor de Deus. Eles representam toda a
humanidade, envolvida pela miséria e pelo sofrimento, sobre quem Deus derrama a
sua bondade, o seu amor, a sua salvação. Também aqui se chama a atenção para a
resposta do homem ao dom de Deus: todos os que experimentam a salvação que Deus
oferece devem reconhecer o dom, acolhê-lo e manifestar a Deus a sua gratidão.
A segunda
leitura define a existência cristã como identificação com Cristo. Quem acolhe o
dom de Deus torna-se discípulo: identifica-se com Cristo, vive no amor e na
entrega aos irmãos e chega à vida nova da ressurreição.
LEITURA I – 2
Reis 5,14-17
Leitura do
Segundo Livro dos Reis
Naqueles dias,
o general
sírio Naamã desceu ao Jordão
e aí mergulhou
sete vezes,
como lhe
mandara Eliseu, o homem de Deus.
A sua carne
tornou-se tenra como a de uma criança
e ficou
purificado da lepra.
Naamã foi ter
novamente com o homem de Deus,
acompanhado de
toda a sua comitiva.
Ao chegar
diante dele, exclamou:
«Agora
reconheço que em toda a terra
não há outro
Deus senão o de Israel.
Peço-te que
aceites um presente deste teu servo».
Eliseu
respondeu-lhe:
«Pela vida do
Senhor que eu sirvo,
nada
aceitarei».
E apesar das
insistências, ele recusou.
Disse então
Naamã:
«Se não
aceitas,
permite ao
menos que se dê a este teu servo
uma porção de
terra para um altar,
tanto quanto
possa carregar uma parelha de mulas,
porque o teu
servo nunca mais há-de oferecer
holocausto ou
sacrifício a quaisquer outros deuses,
mas apenas ao
Senhor, Deus de Israel».
AMBIENTE
A primeira
leitura deste domingo situa-nos no reino do Norte (Israel), durante o reinado
de Jorão (853-842 a .C.).
Os reis de Israel – preocupados em fazer do seu país um estado moderno e em
marcar o seu lugar no xadrez político do antigo Médio Oriente – mantêm, por
esta altura, um intercâmbio muito vivo com os povos da zona. Em termos
religiosos, essa política traduz-se numa invasão de deuses, de cultos e de
valores estrangeiros, que ameaçam a integridade da fé jahwista. Apesar de Jorão
ter tirado “as estátuas que seu pai tinha erigido a Baal” (2 Re 3,2), é uma
época em que os deuses cananeus assumem um grande protagonismo e Baal substitui
Jahwéh no coração e na vida de muitos israelitas.
Nesta fase, o
profeta Eliseu assume-se como o grande defensor da fé jahwista continuando,
aliás, a obra do seu antecessor Elias. Eliseu fazia parte de uma comunidade de
“filhos dos profetas” (2 Re 2,3; 4,1)… Trata-se, provavelmente, de um círculo
profético cujos membros eram os seguidores incondicionais de Jahwéh e aqueles
em quem o Povo buscava apoio, face aos abusos dos poderosos.
No capítulo 5
do segundo Livro dos Reis, os autores deuteronomistas contam-nos a história do
general sírio Naamã: considerado um dos heróis da Síria, era leproso; mas,
informado por uma serva de que em Israel havia um profeta que podia curá-lo do
seu mal, veio ao encontro de Eliseu, carregado de presentes. Eliseu mandou,
apenas, que Naamã se banhasse sete vezes no rio Jordão (cf. 2 Re 5,1-13).
MENSAGEM
A leitura que
nos é proposta descreve a cura do sírio Naamã e as reacções das várias
personagens envolvidas; mas, mais do que apresentar uma reportagem do
acontecimento, os autores deuteronomistas quiseram tecer algumas considerações
de carácter teológico e catequético, que ajudassem os israelitas (seduzidos
pelo culto de Baal) a redescobrir os fundamentos da sua fé.
Em primeiro
lugar, os catequistas de Israel quiseram deixar claro que Jahwéh é o Senhor da
vida, que Ele tem um projecto de libertação para o homem e que só Ele pode
salvar aquele que parece condenado à morte. Deus até Se pode servir de homens
para actuar no mundo; mas é d’Ele – e apenas d’Ele – que brotam a salvação e a
vida; é preciso que os israelitas reconheçam isto, como o sírio Naamã o
reconheceu.
Em segundo
lugar, os catequistas de Israel quiseram mostrar que a intervenção salvadora de
Jahwéh não é uma acção meramente circunstancial, que apenas resolve os
problemas externos, mas é uma acção que actua a um nível profundo e que
transforma radicalmente a vida do homem… Naamã não ficou só curado de uma
doença física que punha em risco a sua vida; mas a intervenção de Deus
saldou-se numa transformação espiritual que fez do sírio Naamã um homem novo e
o levou a deixar os ídolos para servir o verdadeiro e único Deus… A expressão
dessa mudança radical é a afirmação de Naamã de que “não há outro Deus em toda
a terra senão o de Israel” (vers. 15) e que nunca mais irá “oferecer holocausto
ou sacrifício a quaisquer outros deuses, mas apenas ao Senhor, Deus de Israel”
(vers. 17).
Em terceiro
lugar, a história deixa claro que a oferta da salvação não é um dom exclusivo,
reservado a alguns privilegiados ou a uma raça especial: Naamã é sírio e,
portanto, um inimigo tradicional do Povo de Deus… Mas Deus não faz distinção de
pessoas e oferece a todos, sem excepção, a sua graça. O que é decisivo é o
acolher o dom de Deus e aceitar deixar-se transformar por Ele.
Em quarto lugar,
a catequese deuteronomista sublinha a “gratidão” de Naamã. Liberto dos males
que o apoquentavam, ele quis agradecer a sua cura cumulando Eliseu de
presentes; mas depressa percebeu (por acção de Eliseu, que o ajudou a ver
claro) que não era a um homem que tinha de agradecer o dom da vida, mas sim a
Deus… E a sua gratidão manifestou-se numa adesão total a Jahwéh. Os catequistas
de Israel sugerem que é essa a resposta que Deus espera do homem.
Em quinto
lugar, atente-se na atitude de Eliseu que nunca manifestou qualquer vontade de
se aproveitar da intervenção de Deus em favor de Naamã para benefício próprio.
Ao recusar aceitar qualquer presente das mãos de Naamã, Eliseu dá a entender
que não é a ele mas a Jahwéh que o general sírio deve agradecer a cura. É provável
que haja aqui uma denúncia irónica da atitude dos líderes religiosos da época,
sempre preocupados em utilizar Deus em benefício dos seus esquemas egoístas…
ACTUALIZAÇÃO
A reflexão e
partilha podem fazer-se considerando os seguintes dados:
• A leitura
convida-nos, antes de mais, a tomar consciência de que é de Deus – desse Deus
que tem um projecto de salvação para o homem – que recebemos a vida plena. A
constatação desse facto atinge uma importância primordial, numa época em que
somos diariamente convidados a colocar a nossa esperança e a nossa segurança em
ídolos de pés de barro (para alguns, podem ser o “poderoso médium” ou a
“vidente/taróloga/espírita” que garantem a solução para o mau olhado, a inveja,
os males de amor, o insucesso nos negócios, etc.; para a maioria, são o
dinheiro, o poder, a moda, o comodismo, o êxito, a casa com piscina, o Ferrari
ou o último programa de televisão que faz ganhar vinte mil contos e abrir a
janela da fama…). É em Deus que eu coloco a minha esperança de vida plena, ou
há outros deuses que me seduzem, que dirigem a minha vida e que são a minha
esperança de realização e de felicidade?
• Convém
também não esquecer que a proposta de salvação que Deus faz se destina a todos
os homens e mulheres, sem excepção. O nosso Deus não é um Deus dos “bonzinhos”,
dos bem comportados, dos brancos, dos politicamente correctos ou dos que têm o
nome no livro de registos da paróquia… O nosso Deus é o Deus que oferece a vida
a todos e que a todos ama como filhos; o que é decisivo é aceitar a sua oferta
de salvação e acolher o seu dom. Daqui resultam duas coisas importantes: a
primeira é que não basta ser baptizado (e depois prescindir d’Ele e viver à
margem das suas propostas); a segunda é que não podemos marginalizar ou excluir
qualquer irmão nosso.
• A história
do sírio Naamã levanta, ainda, a questão da gratidão… É preciso que nos
apercebamos que tudo é dom do amor de Deus e não uma conquista nossa ou a
recompensa pelos nossos méritos ou pelas nossas boas obras. Estou consciente de
que é de Deus que recebo tudo e manifesto-Lhe a minha gratidão pela sua
presença, pelos seus dons, pelo seu amor?
• Aqueles que
recebem de Deus carismas para pôr ao serviço dos irmãos: sentem-se apenas
instrumentos de Deus e procuram dirigir os olhares e a gratidão dos irmãos para
Deus, ou estão preocupados em sublinhar os seus méritos e em concentrar em si
próprios a gratidão que brota dos corações daqueles a quem servem?
SALMO
RESPONSORIAL – Salmo 97 (98)
Refrão 1: O
Senhor manifestou a salvação a todos os povos.
Refrão 2:
Diante dos povos manifestou Deus a salvação.
Cantai ao
Senhor um cântico novo
pelas
maravilhas que Ele operou.
A sua mão e o
seu santo braço
Lhe deram a
vitória.
O Senhor deu a
conhecer a salvação,
revelou aos
olhos das nações a sua justiça.
Recordou-Se da
sua bondade e fidelidade
em favor da
casa de Israel.
Os confins da
terra puderam ver
a salvação do
nosso Deus.
Aclamai o
Senhor, terra inteira,
exultai de
alegria e cantai.
LEITURA II – 2
Tim 2,8-13
Leitura da
Segunda Epístola do apóstolo São Paulo a Timóteo
Caríssimo:
Lembra-te de
que Jesus Cristo, descendente de David,
ressuscitou
dos mortos, segundo o meu Evangelho,
pelo qual eu
sofro,
até ao ponto
de estar preso a estas cadeias como um malfeitor.
Mas a palavra
de Deus não está encadeada.
Por isso, tudo
suporto por causa dos eleitos,
para que
obtenham a salvação que está em Cristo Jesus,
com a glória
eterna.
É digna de fé
esta palavra:
Se morremos
com Cristo, também com Ele viveremos;
se sofremos
com Cristo, também com ele reinaremos;
se O negarmos,
também Ele nos negará;
se Lhe formos
infiéis, Ele permanece fiel,
porque não
pode negar-Se a Si mesmo.
AMBIENTE
Continuamos a
ler a segunda Carta a Timóteo… Para percebermos a mensagem que o texto nos
propõe, convém recordar que esta carta (escrita por um autor desconhecido que,
no entanto, se identifica com o apóstolo Paulo) nos coloca, provavelmente, no
contexto dos finais do séc. I ou inícios do séc. II, numa altura em as
comunidades cristãs sentiam arrefecido o entusiasmo dos inícios, conheciam a
perseguição e estavam a ser perturbadas pelas heresias e pelas falsas
doutrinas. O autor exorta Timóteo (e, na pessoa de Timóteo, todos os crentes,
em geral) a perseverar na fé, a conservar a sã doutrina recebida de Jesus e a
dedicar-se totalmente ao serviço do Evangelho.
MENSAGEM
Depois de
exortar Timóteo a uma dedicação total ao ministério (cf. 2 Tim 2,1-7), o autor
da carta apresenta o motivo supremo que justifica essa entrega: o exemplo de
Cristo, que chegou à glória da ressurreição pelo caminho da cruz e do dom da
vida… O próprio Paulo seguiu esse duro caminho e é por isso que está preso; mas
não está preocupado, pois o essencial é que a Palavra de Deus continue a
transformar o mundo. Aliás, é preciso que alguns entreguem a própria vida para
que a proposta libertadora de Jesus chegue a todos os homens… Vale a pena
sofrer, a fim de que este objectivo se concretize.
O parágrafo
final (vers. 11-13) corrobora e clarifica as afirmações precedentes. O cristão
é chamado a identificar-se com Cristo na entrega da vida e no serviço aos
irmãos; essa entrega não termina no fracasso e no sem sentido, mas – a exemplo
de Cristo – na ressurreição, na vida nova. O cristão não pode é recusar fazer
da sua vida um dom de amor, se quiser identificar-se com Cristo.
ACTUALIZAÇÃO
Considerar os
seguintes dados para a reflexão e partilha:
• O autor da
Segunda Carta a Timóteo recorda, aqui, algo de central para a experiência
cristã: a essência do cristianismo é a identificação de cada crente com Cristo.
Isto traduz-se, concretamente, no entregar a própria vida em favor dos irmãos,
se necessário até ao dom total. Identifico-me de tal forma com Cristo que sou
capaz de O seguir no caminho do amor e da entrega?
• A opinião
pública do nosso tempo está convencida de que uma vida gasta no serviço simples
e humilde em favor dos irmãos é uma vida fracassada; mas o autor da Segunda
Carta a Timóteo garante que uma vida de amor e de serviço é uma vida plenamente
realizada, pois no final da caminhada espera-nos a ressurreição, a vida plena (são
os efeitos da nossa identificação com Cristo). O que é que, para mim, faz mais
sentido? No meu dia a dia domina o egoísmo e a auto-suficiência, ou o amor, a
partilha, o dom da vida?
ALELUIA – cf.
1Tes 5,18
Aleluia.
Aleluia.
Em todo o
tempo e lugar dai graças a Deus,
porque esta é
a sua vontade a vosso respeito em Cristo Jesus.
EVANGELHO – Lc
17,11-19
Evangelho de
Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Lucas
Naquele tempo,
indo Jesus a
caminho de Jerusalém,
passava entre
a Samaria e a Galileia.
Ao entrar numa
povoação,
vieram ao seu
encontro dez leprosos.
Conservando-se
a distância, disseram em alta voz:
«Jesus,
Mestre, tem compaixão de nós».
Ao vê-los,
Jesus disse-lhes:
«Ide
mostrar-vos aos sacerdotes».
E sucedeu que
no caminho ficaram limpos da lepra.
Um deles, ao
ver-se curado,
voltou atrás,
glorificando a Deus em alta voz,
e prostrou-se
de rosto por terra aos pés de Jesus
para Lhe
agradecer.
Era um
samaritano.
Jesus, tomando
a palavra, disse:
«Não foram dez
que ficaram curados?
Onde estão os
outros nove?
Não se
encontrou quem voltasse para dar glória a Deus
senão este
estrangeiro?»
E disse ao
homem:
«Levanta-te e
segue o teu caminho;
a tua fé te
salvou».
AMBIENTE
Mais uma vez
Lucas apresenta um episódio situado no “caminho de Jerusalém” (esse “caminho
espiritual”, ao longo do qual os discípulos vão aprendendo e interiorizando os
valores e a realidade do “Reino”).
No “caminho”
de Jesus e dos discípulos aparecem, portanto, dez leprosos. O leproso é, no
tempo de Jesus, o protótipo do marginalizado… Além de causar naturalmente
repugnância pela sua aparência e de infundir medo de contágio, o leproso é um
impuro ritual (cf. Lev 13-14), a quem a teologia oficial atribuía pecados
especialmente gravosos (a lepra era o castigo de Deus para esses pecados); por
isso, o leproso não podia sequer entrar na cidade de Jerusalém, a fim de não
despurificar a cidade santa. Devia afastar-se de qualquer convívio humano para
que não contaminasse os outros com a sua impureza física e religiosa. Em caso
de cura, devia apresentar-se diante de um sacerdote, a fim de que ele
comprovasse a cura e lhe permitisse a reintegração na vida normal (cf. Lev 14).
Podia, então, voltar a participar nas celebrações do culto.
Um dos
leprosos (precisamente aquele que vai desempenhar o papel principal, neste
episódio) é samaritano. Os samaritanos eram desprezados pelos judeus de
Jerusalém, por causa do seu sincretismo religioso. A desconfiança religiosa dos
judeus em relação aos samaritanos começou quando, em 721 a .C. (após a queda do
reino do Norte), os colonos assírios invadiram a Samaria e começaram a
misturar-se com a população local. Para os judeus, os habitantes da Samaria
começaram, então, a paganizar-se… Após o regresso do exílio da Babilónia, os
habitantes de Jerusalém recusaram qualquer ajuda dos samaritanos na
reconstrução do Templo e evitaram os contactos com esses hereges, “raça
misturada com pagãos”. A construção de um santuário samaritano no monte Garizim
consumou a separação e, na perspectiva judaica, lançou definitivamente os
samaritanos nos caminhos da infidelidade a Jahwéh. Algumas picardias mútuas nos
séculos seguintes consolidaram a inimizade entre judeus e samaritanos. Na época
de Jesus, a relação entre as duas comunidades era marcada por uma grande
hostilidade.
MENSAGEM
O episódio dos
dez leprosos (que é exclusivo de Lucas) insere-se perfeitamente na óptica
teológica de um evangelho cujo objectivo fundamental é apresentar Jesus como o
Deus que Se fez pessoa para trazer, com gestos concretos, a salvação/libertação
a todos os homens, particularmente aos oprimidos e marginalizados.
É esse o ponto
de partida da história que Lucas nos conta: ele mostra que Deus tem uma
proposta de vida nova e de libertação para oferecer a todos os homens. O número
dez tem, certamente, um significado simbólico: significa “totalidade” (o
judaísmo considerava necessário que pelo menos dez homens estivessem presentes,
a fim de que a oração comunitária pudesse ter lugar, porque o “dez” representa
a totalidade da comunidade). A presença de um samaritano no grupo indica,
contudo, que essa salvação oferecida por Deus, em Jesus, não se destina apenas
à comunidade do “Povo eleito”, mas se destina a todos os homens, sem excepção,
mesmo àqueles que o judaísmo oficial considerava definitivamente afastados da
salvação.
Contudo, o
acento do episódio de hoje é posto – mais do que no episódio da cura em si – no
facto de que, dos dez leprosos curados, só um tenha voltado para trás para
agradecer a Jesus e no facto de este ser um samaritano. Lucas está interessado
em mostrar que quem recebe a salvação deve reconhecer o dom de Deus e deve
estar agradecido… E avisa que, com frequência, são os hereges, os marginais, os
desprezados, aqueles que a teologia oficial considera à margem da salvação, que
estão mais atentos aos dons de Deus. Haverá aqui, certamente, uma alusão à
auto-suficiência dos judeus que, por se sentirem “Povo eleito”, achavam natural
que Deus os cumulasse dos seus dons; no entanto, não reconheceram a proposta de
salvação que, através de Jesus, Deus lhes ofereceu… Certamente haverá aqui,
também, um apelo aos discípulos de Jesus, para que não ignorem o dom de Deus e
saibam responder-Lhe com a gratidão e a fé (entendida como adesão a Jesus e à
sua proposta de salvação).
ACTUALIZAÇÃO
A reflexão e
partilha podem tocar as seguintes questões:
• A “lepra”
que rouba a vida a esses “dez” homens que a leitura de hoje nos apresenta
representa o infortúnio que atinge a totalidade da humanidade e que gera
exclusão, marginalidade, opressão, injustiça. É a condição de uma humanidade
marcada pelo sofrimento, pela miséria, pelo afastamento de Deus e dos irmãos,
que aqui nos é pintada… Lucas garante, no entanto, que Deus tem um projecto de
salvação para todos os homens, sem excepção; e que é em Jesus e através de
Jesus que esse projecto atinge todos os que se sentem “leprosos” e os faz
encontrar a vida plena, a reintegração total na família de Deus e na comunidade
humana.
• É preciso
ter uma resposta de gratidão e de adesão à proposta de salvação que Deus faz.
Atenção: muitas vezes são aqueles que parecem mais fora da órbita de Deus que
primeiro reconhecem o seu dom, que o acolhem e que aderem à proposta de vida
nova que lhes é feita. Às vezes, aqueles que lidam diariamente com o mundo do
sagrado estão demasiado cheios de auto-suficiência e de orgulho para acolherem
com humildade e simplicidade os dons de Deus, para manifestarem gratidão e para
aceitarem ser transformados pela graça… Convém pensar na atitude que, dia a
dia, eu assumo diante de Deus: se é uma atitude de auto-suficiência, ou se é
uma atitude de adesão humilde e de gratidão.
• Como lidamos
com aqueles que a sociedade de hoje considera “leprosos” e que, muitas vezes,
se encontram numa situação de exclusão e de marginalidade (os sem abrigo, os
drogados, os deficientes, os doentes terminais, os idosos abandonados em lares,
os analfabetos, os que vivem abaixo do limiar da pobreza, os que não têm
telemóvel nem internet, os que não vestem de acordo com a moda, os que não
pactuam com certos valores politicamente correctos, os que não consomem
produtos “light” e não têm uma silhueta moderna, os que não frequentam as
festas sociais nem aparecem nos programas televisivos de sucesso…): com
desprezo, com indiferença, com medo de ficar contaminados ou como testemunhas
da bondade e do amor de Deus?
•
Curiosamente, os dez “leprosos” não são curados imediatamente por Jesus, mas a
“lepra” desaparece “no caminho”, quando iam mostrar-se aos sacerdotes. Isto
sugere que a acção libertadora de Jesus não é uma acção mágica, caída
repentinamente do céu, mas um processo progressivo (o “caminho” define, neste
contexto, a caminhada cristã), no qual o crente vai descobrindo e
interiorizando os valores de Jesus, até à adesão plena às suas propostas e à
efectiva transformação do coração. Assim, a nossa “cura” não é um momento
mágico que acontece quando somos baptizados, ou fazemos a primeira comunhão ou
nos crismamos; mas é uma caminhada progressiva, durante a qual descobrimos
Cristo e nascemos para a vida nova.
ALGUMAS
SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O 28º DOMINGO DO TEMPO COMUM
(adaptadas de
“Signes d’aujourd’hui”)
Ao longo dos
dias da semana anterior ao 28º Domingo do Tempo Comum, procurar meditar a
Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia,
por exemplo… Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra:
num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais,
numa comunidade religiosa… Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno
a Palavra de Deus.
2. PALAVRA
CELEBRADA NA EUCARISTIA.
A Palavra de
Deus não se limita ao tempo da proclamação e da escuta da Palavra. Na
preparação da celebração, procurar que algumas expressões da liturgia da
Palavra estejam presentes no momento penitencial, nalguma intenção da oração
dos fiéis, num momento de acção de graças… Hoje, a liturgia da Palavra está
unificada à volta do tema da salvação e tem um sentido dialogal: Deus dá a
graça, nós damos graças pelo dom da salvação, o dom do seu amor.
3. BILHETE DE
EVANGELHO.
É preciso ser
um samaritano, um dos habitantes da Samaria com os quais os Judeus não querem
ter nada em comum, a vir até Jesus após a sua cura, para ter um acto de
reconhecimento. Sim, ele reconhece que Deus o curou pois ele glorifica-O,
enquanto Jesus reconhecerá que a sua fé o salvou. Ele é salvo precisamente
porque reconhece Aquele que o salva. Tal é a diferença em relação aos outros
nove leprosos curados que não reconhecem Aquele que os purificou. Enfim, o
leproso samaritano faz acto de reconhecimento vindo agradecer: lança o rosto
por terra aos pés de Jesus dando-Lhe graças. O homem pode levantar-se porque
está totalmente salvo: não apenas o seu corpo é purificado mas, ao vir
glorificar Deus e dar-Lhe graças, pode aproximar-se de Jesus, o verdadeiro Salvador,
que salva o homem e dele espera a caminhada da fé.
4. À ESCUTA DA
PALAVRA.
Todos os pais
têm a preocupação em ensinar aos seus filhos “se faz favor” e “obrigado”. Isso
faz parte da boa educação. Mas estas duas palavras estão carregadas de um
sentido que a criança deve descobrir progressivamente: ninguém consegue
sozinho, todos temos necessidade dos outros. Reconhecer que, sozinho, não posso
fazer tudo; tenho necessidade de receber, de pedir. E dizendo obrigado aos
outros, reconheço que me fizeram bem. Enfim, estas palavras, que parecem tão
banais, exprimem a dimensão social do ser humano. A comunidade humana e a
comunidade cristã constroem-se através destas relações, destes contactos
quotidianos nos quais cada um se reconhece, em todos os sentidos desta palavra.
Hoje, Jesus convida-nos a recordar tudo isso na nossa relação com Deus. Os dez
leprosos vieram até Ele porque reconheciam n’Ele um mestre, um enviado de Deus.
Ousam pedir o que ninguém podia dar naquela época: a cura da lepra. Pedem um
favor que ultrapassa as forças humanas. É a Deus que se dirigem através de
Jesus. Pedem a Jesus e Ele cura-os. Mas um só vem dizer “obrigado”. Um
estrangeiro, um samaritano. Talvez os outros pensassem que tinham o direito de
serem curados por serem judeus… O estrangeiro, esse, reconhece que a sua cura é
dom gratuito da bondade de Deus. Volta junto de Jesus para “reconhecer” este
dom. Entra numa relação plena com Deus. Veio com a sua pobreza, para pedir;
regressa, com a sua gratidão, para reconhecer que Jesus respondeu ao seu
pedido. O acto central, fonte e cume da vida cristã, a Eucaristia, significa
“acção de graças”. Eis o pedido supremo que podemos dirigir a Deus: que nos dê
a sua presença em Jesus ressuscitado e o nosso “obrigado”, o mais perfeito
possível que possamos dizer a Deus. Aí, estamos bem no coração da nossa fé e do
nosso amor.
5. ORAÇÃO
EUCARÍSTICA.
Pode-se
escolher a Oração Eucarística III para as Assembleias com Crianças, que exprime
muito simplesmente o obrigado, a acção de graças; rezá-la bem, com calma…
6. PALAVRA
PARA O CAMINHO DA VIDA…
Levar a
Palavra de Deus como luz para mais uma semana de trabalho, de estudo… Ao longo
dos dias da semana que se segue, procurar rezar e meditar algumas frases da
Palavra de Deus: “Cantai ao Senhor um cântico novo”…; “A Palavra de Deus não
está encadeada”…; “Se morremos com Cristo, também com Ele viveremos”…;
“Levanta-te e segue o teu caminho; a tua fé te salvou”… Procurar transformá-las
em atitudes e em gestos de verdadeiro encontro com Deus e com os próximos que formos
encontrando nos caminhos percorridos da vida…
UNIDOS PELA
PALAVRA DE DEUS
PROPOSTA PARA
ESCUTAR,
PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
Grupo
Dinamizador:
P. Joaquim
Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
Província
Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
Rua Cidade de
Tete, 10 – 1800-129 LISBOA – Portugal
Tel. 218540900
– Fax: 218540909