3° Domingo do Tempo Comum, Ano A 12
Roteiro Homilético 12: Ordem do Carmo Portugual
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Na primeira
parte (cf. Mt 4,12-16), Mateus refere como Jesus abandona Nazaré, o seu lugar
de residência habitual, e se transfere para Cafarnaúm. Mateus descobre nesse
facto um significado profundo, à luz de Is 8,23-9,1: a “luz” que havia de
eliminar as trevas e as sombras da morte de que fala Isaías é, para Mateus, o
próprio Jesus. Na terra humilhada de Zabulão e Neftali, vai começar a brilhar a
luz da libertação; e essa libertação vai atingir, também, os pagãos que
acolherem o anúncio do Reino (para Mateus, é bem significativo que o primeiro
anúncio ecoe na Galileia, terra onde os gentios se misturam com os judeus e,
concretamente, em Cafarnaúm, a cidade que, pela sua situação geográfica, é uma
ponte para as terras dos pagãos). O anúncio libertador de Jesus apresenta,
desde logo, uma dimensão universal.
Na segunda
parte (cf. Mt 4,17-23), Mateus apresenta o lançamento da missão de Jesus:
define-se o conteúdo básico da pregação que se inicia, mostra-se o “Reino” como
realidade viva actuante, apresentam-se os primeiros discípulos que acolhem o
apelo do “Reino” e que vão acompanhar Jesus na missão.
Qual é, em
primeiro lugar, o conteúdo do anúncio? O versículo 17 di-lo de forma clara:
Jesus veio trazer “o Reino”. A expressão “Reino de Deus” (ou “Reino dos céus”,
como prefere dizer Mateus) refere-se, no Antigo Testamento e na época de Jesus,
ao exercício do poder soberano de Deus sobre os homens e sobre o mundo.
Decepcionado com a forma como os reis humanos exerceram a realeza (no discurso
profético aparecem, a par e passo, denúncias de injustiças cometidas pelos reis
contra os pobres, de atropelos ao direito orquestrados pela classe dirigente,
de responsabilidades dos líderes no abandono da aliança, de graves omissões no
que diz respeito aos compromissos assumidos para com Jahwéh), o Povo de Deus
começa a sonhar com um tempo novo, em que o próprio Deus vai reinar sobre o seu
Povo; esse reinado será marcado – na perspectiva dos teólogos de Israel – pela
justiça, pela misericórdia, pela preocupação de Deus em relação aos pobres e
marginalizados, pela abundância e fecundidade, pela paz sem fim.
Jesus tem
consciência de que a chegada do “Reino” está ligada à sua pessoa. O seu
primeiro anúncio resume-se, para Mateus, no seguinte slogan: “arrependei-os
porque o Reino dos céus está a chegar”. O convite à conversão (“metanoia”) é um
convite a uma mudança radical na mentalidade, nos valores, na postura vital.
Corresponde, fundamentalmente, a reorientar a vida para Deus, a reequacionar a
vida, de modo a que Deus e os seus valores passem a estar no centro da
existência do homem; só quando o homem aceita que Deus ocupe o lugar que Lhe
compete, está preparado para aceitar a realeza de Deus. Então, o “Reino” pode
nascer e tornar-se realidade no mundo e nos corações. Na sequência, Mateus
apresenta Jesus a construir activamente o “Reino” (vers. 23-24): as suas palavras
anunciam essa nova realidade e os seus gestos (os milagres, as curas, as
vitórias sobre tudo o que rouba a vida e a felicidade do homem) são sinais
evidentes de que Deus começou já a reinar e a transformar a escravidão em vida
e liberdade.
Finalmente,
Mateus descreve o chamamento dos primeiros discípulos (vers. 18-22). Através da
resposta pronta de Pedro e André, Tiago e João, propõe-se um exemplo da
conversão radical ao “Reino” e de adesão às suas exigências. O relato sublinha
uma diferença fundamental entre os chamados por Jesus e os discípulos que se
juntavam à volta dos mestres do judaísmo: não são os discípulos que escolhem o
mestre e pedem para entrar no seu grupo, como acontecia com os discípulos dos
“rabbis”; mas a iniciativa é de Jesus, que chama os discípulos que Ele próprio
escolheu, que os convida a segui-l’O e lhes propõe uma missão.
A resposta dos
quatro discípulos ao chamamento é paradigmática: renunciam à família, ao seu
trabalho, às seguranças instituídas e seguem Jesus sem condições. Esta ruptura
(que significa não só uma ruptura afectiva com pessoas, mas também a ruptura
com um quadro de referências sociais e de segurança económica) indicia uma
opção radical pelo “Reino” e pelas suas exigências.
Uma palavra
para a missão que é proposta aos discípulos que aceitam o desafio do “Reino”:
eles serão pescadores de homens. O mar é, na cultura judaica, o lugar dos
demónios, das forças da morte que se opõem à vida e à felicidade dos homens; a
tarefa dos discípulos que aceitam integrar o “Reino” será, portanto, libertar
os homens dessa realidade de morte e de escravidão em que eles estão
mergulhados, conduzindo-os à liberdade e à realização plenas.
Estes quatro
discípulos representam todo o grupo dos discípulos, de todos os tempos e
lugares. Eles devem responder positivamente ao chamamento, optar pelo “Reino” e
pelas suas exigências e tornarem-se testemunhas da vida e da salvação de Deus
no meio dos homens e do mundo.
Palavra para o
caminho
Naquele
momento, a situação é trágica. Inspirando-se num texto do profeta Isaías,
Mateus vê que “o povo habita nas trevas”. Sobre a terra “há sombras de morte”.
Reina o caos, a injustiça e o mal. A vida não pode crescer. As coisas não são
como Deus as quer. Aqui não reina o Pai.
Entretanto, no
meio das trevas, o povo começará a ver “uma grande luz”. Entre as sombras da
morte, “começa a brilhar uma luz”. Jesus é sempre isso: uma grande luz que
brilha no mundo.
Dentro da
Igreja há uma “grande luz”. É Jesus. Nele Deus revela-se a nós. Não devemos
ocultá-lo com o nosso protagonismo. Não podemos suplantá-lo com nada. Se a luz
de Jesus se apaga, os cristãos converter-se-ão naquilo que Jesus tanto temia:
“uns cegos procurando guiar outros cegos”.