31º domingo do tempo comum, Ano C 12
Roteiro Homilético 12: Ordem do Carmo Portugual
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Jesus
atravessa a cidade de Jericó, antes de entrar na última etapa do seu percurso, 27 km de uma longa subida que
o levará a Jerusalém. Jericó é um belo e aprazível oásis que se estende por
cinco quilómetros, situado a cerca de 300 metros abaixo do nível
do mar. Jerusalém situa-se a cerca de 800 metros acima do
nível do mar. O caminho de Jesus – e dos seus discípulos com ele – torna-se
agora, portanto, uma intensa subida física e espiritual.
A assinalar
esta passagem de Jesus por Jericó, aí está mais um encontro decisivo,
instrutivo e salvador de Jesus (Lucas 19,1-10), «que veio PROCURAR e SALVAR o
que estava perdido», como Jesus diz de si mesmo no final da narrativa (Lucas
19,10). O início da narrativa apresenta-se um homem, de nome Zaqueu, que era rico
e chefe de publicanos, e que PROCURAVA VER
QUEM É Jesus.
Cruzam-se o
início e o final da narrativa, cruzando estas duas PROCURAS: Jesus PROCURA
salvar o que está perdido; Zaqueu PROCURA ver quem é Jesus. Note-se bem que a
narrativa não diz que Zaqueu PROCURAVA ver Jesus, o que equivaleria a ver o seu
rosto, o seu aspecto, a roupa que vestia… Diz, antes, que Zaqueu PROCURAVA ver
quem era Jesus. Entenda-se, portanto, que o que Zaqueu PROCURAVA ver não era o
rosto, o aspecto, o exterior de Jesus, mas a sua identidade, a sua intimidade,
o seu modo de ser.
Diz ainda o
nosso belo texto que Zaqueu não conseguia ver quem era Jesus por causa da
multidão, por ser de pequena estatura. Numa primeira vaga de leitura, fica-se
com a impressão de que Zaqueu era um homem baixo e que, por esse motivo,
atolado no meio da multidão, não conseguia realizar o seu objectivo de ver quem
era Jesus. Numa segunda vaga de leitura, percebemos melhor por que razão Zaqueu
não podia ver quem era Jesus por causa da multidão. É que, sendo ele chefe de
publicanos, então era um traidor à sua pátria judaica, colaboracionista com os
ocupantes romanos, cobrando impostos aos seus irmãos de raça e levando-os aos
romanos. Traidor, colaboracionista, explorador e ladrão, Zaqueu era o odiado
Zaqueu. Salta à vista que não podia estar no meio da multidão, que, se o
descobrisse, o cobriria de insultos, cuspidelas, pontapés…
É esta a razão
que o faz correr adiante (onde não estava a multidão), e subir a um sicómoro,
para, daí, escondido na densa copa do sicómoro, poder ver e não ser visto,
ficando, portanto, a coberto da multidão.
Mas também
fica claro que, de dentro da copa do sicómoro, Zaqueu conseguiria certamente
ver Jesus, mas não QUEM ERA Jesus. Para ver quem é Jesus, a sua identidade e
intimidade, é preciso um encontro com Jesus. É aqui que entra o outro
PROCURADOR, que é Jesus. Levanta os olhos, vê Zaqueu escondido na copa do
sicómoro, e diz-lhe de imediato: «Zaqueu, desce depressa: HOJE na tua casa é
preciso que eu fique!» (Lucas 19,5).
Zaqueu desceu
depressa e recebeu Jesus com ALEGRIA. Zaqueu começa aqui a ver quem é Jesus:
não o insulta, não o exclui, não o empurra. Chama-o, acolhe-o, inclui-o! Em
contraponto, a multidão viu e reprovou, dizendo: «Foi hospedar-se em casa de um
pecador» (Lucas 19,7). Mas em casa, tu a tu, Zaqueu pode continuar a ver quem é
Jesus, e vai virar do avesso a sua vida toda, DANDO, DANDO, DANDO. Aos pobres e
àqueles (muitos) a quem roubou. E Jesus pode dizer com verdade: «HOJE veio a
salvação a esta casa!» (Lucas 19,9).
Conclusão
sempre nova: Zaqueu não dá aos pobres para ser salvo, mas porque foi salvo!
Palavra para o
caminho
Lucas narra o
episódio de Zaqueu para que os seus leitores descubram melhor o que podem
esperar de Jesus: o Senhor que invocam e seguem nas comunidades cristãs «veio
procurar e salvar o que estava perdido».
Ao mesmo
tempo, o seu relato da actuação de Zaqueu ajuda a responder à pergunta que não
poucos levam no seu interior: «Todavia posso mudar? Não é já demasiado tarde
para refazer uma vida que, em boa parte, deixei perder? Que passos posso dar?».
Zaqueu é descrito
com dois traços que definem com precisão a sua vida. É «chefe de publicanos» e
é «rico».Em Jericó todos sabem que é um pecador. Um homem que não serve a Deus
mas sim ao dinheiro. A sua vida, como tantas outras, é pouco humana.
No entanto,
Zaqueu «procura ver Jesus». O homem terá que superar diferentes obstáculos. É
«baixo de estatura», sobre tudo porque a sua vida não está motivada por ideais
muito nobres. As pessoas são outro impedimento: terá que superar preconceitos
sociais que lhe tornam difícil o encontro pessoal e responsável com Jesus.
Mas Zaqueu
prossegue a sua procura com simplicidade e sinceridade. Só quer encontrar o
momento e o lugar adequado para entrar em contacto com Jesus. Quer vê-Lo.
É então quando
descobre que também Jesus o está a procurar pois chega até àquele lugar,
procura-o com o olhar e diz: «O encontro será hoje mesmo na tua casa de
pecador». Zaqueu desce e recebe-o em sua casa, cheio de alegria. Há momentos
decisivos em que Jesus passa pela nossa vida porque quer salvar o que nós
estamos a deitar a perder. Não os devemos deixar escapar.
Lucas não
descreve o encontro. Só fala da transformação de Zaqueu. Muda a forma de ver a
vida: já não pensa só no seu dinheiro mas no sofrimento dos outros. Muda o seu
estilo de vida: fará justiça aos que explorou e partilhará os seus bens com os
pobres.A partir deste momento a vida de Zaqueu transforma-se, tem outra
orientação.
Zaqueu só se
resolveu a ser generoso após o encontro com Jesus e após ter feito a
experiência do amor de Deus. O amor de Deus não se derramou sobre Zaqueu depois
de ele ter mudado de vida; mas foi o amor de Deus – que Zaqueu experimentou
quando ainda era pecador – que provocou a conversão e que converteu o egoísmo
em generosidade. Prova-se, assim, que só a lógica do amor pode transformar o
mundo e os corações dos homens.