Roteiro Homilético 1: Mensagem
(cnbbleste2.org.br Dom Emanuel Messias de Oliveira)
1ª LEITURA -
Am 7,12-15
O tempo de
Amós era um tempo de “milagre econômico”, ou seja, aparente prosperidade da
nação às custas de tremenda injustiça para com o povo oprimido, empobrecido e
escravizado pelo estado e por uma elite privilegiada e desonesta. Também a
religião estava em
decadência. Tudo isso sacudiu o interior vulcânico do pastor
de Técua que, de vaqueiro e cultivador de sicômoros, sentiu-se chamado a ser
profeta, ou seja, a gritar em nome do Deus da justiça, do Deus da Aliança.
Ele sai de Técua e vai a Betel - o santuário
real - e ali denuncia a opressão, a
injustiça e o desprezo da Aliança. O luxo, o roubo e o falso culto causam
indignação ao profeta. O sacerdote
Amasias reage violentamente, acusa-o diante do rei, chama-o de vidente,
de falso profeta profissional para assim ganhar o seu pão. Então, Amós vai
justificar sua vocação profética. Amós diz que nunca pertenceu à corporação de
profetas profissionais. Ele era vaqueiro e colhia figos selvagens. Foi o Senhor
que o desenraizou de seu torrão natal, afastou-o da sua humilde profissão e o
chamou para profetizar. Eis as palavras do Senhor: “Vá e fale como profeta a
meu povo de Israel”. O chamado de Javé é uma ordem à qual não se pode fugir.
Amós é profeta de verdade, reveste-se de coragem e enfrenta sacerdotes e reis
em nome de Deus. Se você quiser experimentar a veemência profética do grande
Amós prolongue por mais dois versículos a leitura do texto de hoje. Profeta é
aquele que anuncia e denuncia. Você tem coragem também de denunciar?
2ª LEITURA -
Ef 1,3-10
Esta carta,
atribuída ao grande apóstolo Paulo, é uma espécie de carta circular dirigida às
comunidades da Ásia Menor. Ela poderia ser divida em duas grandes partes: a primeira parte seria uma
parte doutrinal - capítulos 1-3.
A segunda parte são exortações morais - capítulos 4-6.
Nosso texto
deixa bem claro a centralidade de Cristo em tudo. Começa
bendizendo ao Pai de N.S.J.C., que, em Cristo,
nos cumulou com toda a espécie de bênçãos; é um hino de louvor composto
de seis bênçãos, se o prolongarmos até o versículo 14. Em síntese, o Pai nos
abençoou em Cristo com a eleição (v. 4), a predestinação (vv. 8-10), a redenção (v. 17), a recapitulação (vv. 8-10),
a herança (vv. 11-12) e o Espírito Santo (vv. 13-14).
1ª e 2ª
bênçãos (vv.4-6) são a eleição e a predestinação: “Nele, Deus nos escolheu,
antes da fundação do mundo, para sermos
santos e íntegros diante dele, no amor. “Santos e íntegros”: fomos destinados a
ser: “Filhos adotivos”: O filho é sempre da mesma natureza do Pai. Assim é
Jesus. Mas nós não somos da mesma natureza de Deus; Deus é divino, nós somos
humanos, mas Deus nos adotou como filhos em Jesus Cristo , por
isso somos filhos adotivos. A finalidade é “o louvor de sua graça gloriosa com que nos agraciou no seu bem-amado (v.6).
3ª bênção
(vv.7-9) é a redenção através do sangue de Cristo que nos liberta da escravidão
do pecado.
4ª bênção
(v.10) é a realidade do projeto de Deus: “reencabeçar tudo em Cristo, tudo o
que existe no céu e na terra”. Este é o mistério da vontade de Deus, que, na
plenitude dos tempos, nos foi revelado em Jesus Cristo.
5ª e 6ª
bênçãos (vv. 11-14) dizem respeito aos judeus que já tinham parte na herança e
aos gentios que são incorporados ao povo de Deus e marcados pelo Espírito,
garantia desta herança. Você reconhece e agradece a Deus por tantas
bênçãos? Enumere outras.
EVANGELHO - Mc
6,7-13
Estamos diante
de um texto de vocação e missão. Jesus chama e envia em missão. Jesus enviou
os 12, dois a dois. Jesus não envia apenas 12 pessoas, mas os 12, ou seja, os
fundamentos do novo povo de Deus - a Igreja. Jesus começa algo totalmente novo.
Os 12 fundamentam esta novidade. A novidade não é uma doutrina nova, mas uma pessoa:
Jesus Cristo homem-Deus. A Igreja é missionária desde suas origens. Os 12 não
devem agir isoladamente, devem partir 2 a 2, pois segundo o Dt
19,15 “A sentença se apoiará na palavra
de duas ou três testemunhas.”
Jesus lhes dá poder contra as forças do mal;
contra tudo aquilo que foi considerado como força maligna. Só Deus é absoluto.
O mal em suas várias formas e manifestações é habitualmente chamado pelos
judeus de espírito imundo ou demônio. Os missionários devem ser desprendidos de
bens materiais, só devem levar consigo cajado na mão, sandália aos pés e uma
túnica no corpo. Nada de comer, nada de sacola, nada de dinheiro. Este
desprendimento é o sinal de sua fidelidade, é o triunfo e a alegria da privação
por solidariedade com alguém - menos favorecido. Busca de próprios interesses é
contratestemunho. Eles não devem andar de casa em casa, mas em cada lugar devem
hospedar-se apenas numa casa. É a urgência escatológica da missão. Acabou o
tempo da espera: “Completou-se o tempo, e
o Reino de Deus está próximo. Convertei-vos e crede na Boa-Nova” (Mc 1,15). Caso eles
sejam mal recebidos num lugar e o povo não os escutar, eles devem sacudir a
poeira dos pés, como se faz no Oriente, como sinal de protesto e de ruptura.
Não acolher os missionários e não escutá-los significa rejeição da mensagem de
salvação. É preciso decidir a favor ou contra o Reino; os missionários não
podem esperar muito, pois o tempo é curto e não há uma segunda chance.
Em Jo 3,18
lemos: “Quem crer nele não será condenado. Qual é o núcleo do conteúdo da
mensagem e da atividade apostólica? É o convite à conversão, expulsão de
demônios e curas através da unção com óleo. Por que conversão? Porque na
realidade”, chegou algo totalmente novo em Jesus Cristo , chegou
o Reino de Deus (1,15). Este relato de missão retrata a preocupação da
comunidade primitiva em legitimar sua missão apostólica como uma ordem do
Cristo histórico. Você tem consciência de ser um vocacionado, um discípulo
missionário, ou seja, chamado a servir a Igreja - Comunidade? Qual é a sua
missão específica na Comunidade?
Roteiro Homilético 2: Dehonianos de Portugal
(http://www.dehonianos.org/)
Tema do 15º
Domingo do Tempo Comum
A liturgia do
15º Domingo do Tempo Comum recorda-nos que Deus actua no mundo através dos homens
e mulheres que Ele chama e envia como testemunhas do seu projecto de salvação.
Esses “enviados” devem ter como grande prioridade a fidelidade ao projecto de
Deus e não a defesa dos seus próprios interesses ou privilégios.
A primeira
leitura apresenta-nos o exemplo do profeta Amós. Escolhido, chamado e enviado
por Deus, o profeta vive para propor aos homens – com verdade e coerência – os
projectos e os sonhos de Deus para o mundo. Actuando com total liberdade, o
profeta não se deixa manipular pelos poderosos nem amordaçar pelos seus
próprios interesses pessoais.
A segunda
leitura garante-nos que Deus tem um projecto de vida plena, verdadeira e total
para cada homem e para cada mulher – um projecto que desde sempre esteve na
mente do próprio Deus. Esse projecto, apresentado aos homens através de Jesus
Cristo, exige de cada um de nós uma resposta decidida, total e sem
subterfúgios.
No Evangelho,
Jesus envia os discípulos em
missão. Essa missão – que está no prolongamento da própria
missão de Jesus – consiste em anunciar o Reino e em lutar objectivamente contra
tudo aquilo que escraviza o homem e que o impede de ser feliz. Antes da partida
dos discípulos, Jesus dá-lhes algumas instruções acerca da forma de realizar a
missão… Convida-os especialmente à pobreza, à simplicidade, ao despojamento dos
bens materiais.
LEITURA I – Am
7,12-15
Leitura da
Profecia de Amós
Naqueles dias,
Amasias,
sacerdote de Betel, disse a Amós:
«Vai-te daqui,
vidente.
Foge para a
terra de Judá.
Aí ganharás o
pão com as tuas profecias.
Mas não
continues a profetizar aqui em Betel,
que é o
santuário real, o templo do reino».
Amós respondeu
a Amasias:
«Eu não era
profeta, nem filho de profeta.
Era pastor de
gado e cultivava sicómoros.
Foi o Senhor
que me tirou da guarda do rebanho e me disse:
‘Vai
profetizar ao meu povo de Israel’».
AMBIENTE
Amós, o
“profeta da justiça social”, exerceu o seu ministério profético no reino do
Norte (Israel) em meados do séc. VIII a.C. (possivelmente, por volta de 762 a . C.), durante o reinado
de Jeroboão II. É uma época de prosperidade económica e de tranquilidade
política: as conquistas de Jeroboão II alargaram consideravelmente os limites
do reino e permitiram a entrada de tributos dos povos vencidos; o comércio e a
indústria (mineira e têxtil) desenvolveram-se significativamente… As
construções da burguesia urbana atingiram um luxo e magnificência até então
desconhecidos.
A prosperidade
e bem-estar das classes favorecidas contrastavam, porém, com a miséria das
classes baixas. O sistema de distribuição estava nas mãos de comerciantes sem
escrúpulos que, aproveitando o bem-estar económico, especulavam com os preços.
Com o aumento dos preços dos bens essenciais, as famílias de menores recursos
endividavam-se e acabavam por se ver espoliadas das suas terras em favor dos
grandes latifundiários. A classe dirigente, rica e poderosa, dominava os
tribunais e subornava os juízes, impedindo que o tribunal fizesse justiça aos
mais pobres e defendesse os direitos dos menos poderosos.
Entretanto, a
religião florescia num esplendor ritual nunca visto. Magníficas festas,
abundantes sacrifícios de animais, um culto esplendoroso, marcavam a vida
religiosa dos israelitas… O problema é que esse culto não tinha nada a ver com
a vida: no dia a dia, os mesmos que participavam nesses ritos cultuais
majestosos praticavam injustiças contra o pobre e cometiam toda a espécie de
atropelos ao direito. Ainda mais: os ricos ofereciam a Deus abundantes ofertas,
a fim de serenar as suas consciências culpadas e a fim de assegurar a cumplicidade
de Deus para os seus negócios escuros… Além disso, a influência da religião
cananeia estava a levar os israelitas para o sincretismo religioso: o culto a
Jahwéh misturava-se com rituais pagãos provenientes dos cultos a Baal e
Astarte. Essa confusão religiosa punha em sérios riscos a pureza da fé
jahwista.
É neste
contexto que aparece o profeta Amós. Natural de Técua (uma pequena aldeia
situada no deserto de Judá), Amós não é profeta profissional; mas, chamado por
Deus, deixa a sua terra e parte para o reino vizinho para gritar à classe
dirigente a sua denúncia profética. A rudeza do seu discurso, aliada à
integridade e afoiteza da sua fé, traz algo do ambiente duro do deserto e
contrasta com a indolência e o luxo da sociedade israelita da época.
O episódio que
a primeira leitura deste domingo nos propõe leva-nos até ao santuário de Betel,
no centro da Palestina. Trata-se de um lugar considerado sagrado, desde tempos
imemoriais. De acordo com Gn 35,1-8, Jacob construiu aí um altar e dedicou-o a
Jahwéh. Mais tarde, Betel aparece como o local onde se reúne a assembleia de
“todo o Israel” para “consultar Deus” (cf. Jz 20,18), para chorar diante de
Deus a sua infelicidade (cf. Jz 20,26) e para se encontrar com Deus (cf. Jz
21,2). Tudo isto reflecte a importância cultual do lugar.
Quando o Povo
de Deus se dividiu em dois reinos, após a morte de Salomão (932 a .C.), os reis do norte
(Israel) potenciaram o culto em Betel, para impedir que os seus súbditos
tivessem de deslocar-se a Jerusalém, situado no reino inimigo do sul (Judá).
Então, Betel transformou-se numa espécie de “santuário oficial” do regime, onde
o culto era financiado, em grande parte, pelo próprio rei. O sacerdote que
presidia ao culto era uma espécie de “funcionário real”, encarregado de zelar
para que os interesses do rei fossem defendidos, nesse local por onde passava
uma parte significativa dos fiéis de Israel. Na época em que Amós exerce o seu
ministério profético em Betel, o sacerdote encarregado do santuário era um tal
Amasias. Alguns elementos que chegaram até nós parecem indiciar também a
existência em Betel de uma imagem de um bezerro, que representava Jahwéh e que
era adorado pelos fiéis (cf. Os 10,5).
Betel é um dos
lugares onde ecoa a denúncia profética de Amós. Provavelmente, Amós criticou as
injustiças cometidas pelo rei e pela classe dirigente; e, certamente,
denunciou, nesse lugar, um culto que era aliado da injustiça e que procurava
comprometer Deus com os esquemas corruptos dos poderosos.
MENSAGEM
O nosso texto
descreve o confronto entre o sacerdote Amasias e o profeta Amós. É um texto
fundamental para entendermos a missão do profeta, a sua liberdade face aos
interesses do mundo e dos poderes instituídos.
O sacerdote
Amasias é o homem da religião oficial, enfeudada aos interesses do rei e da
ordem estabelecida, comprometida com o poder político. Para ele, o que
interessa é manter intocável um sistema que assegura benefícios mútuos, quer ao
trono, quer ao altar. Nesse sistema, o rei é o guardião supremo da ordem
instituída e não há lugar (nem necessidade) de uma intervenção que ponha em
causa a ordem estabelecida. A tarefa da religião é, na perspectiva de Amasias,
proteger e legitimar os interesses do rei; em troca, o rei sustenta o
santuário. Trono e religião são, assim, cúmplices ligados por interesses
mútuos, que fazem tudo para manter o “statu quo” e os privilégios. O próprio
Amasias tem muito a perder, se as coisas não correrem bem, já que é um
funcionário real cuja função é defender os interesses do rei. A religião de
Amasias é uma religião escrava dos interesses, que se ajoelha diante dos
poderosos e que está completamente fechada aos desafios de Deus (que, se fossem
escutados e acolhidos, poderiam desarranjar o sistema). Nesta perspectiva, a
denúncia de Amós soa a rebelião contra os interesses enlaçados do poder e da
religião, a doutrina subversiva que põe em causa as estruturas e que abala os
fundamentos da ordem estabelecida. Por isso, há que usar toda a força do
sistema para calar a voz incómoda do profeta. Amós é, portanto, denunciado,
convidado a deixar o santuário e a voltar à sua terra para “ganhar aí o seu
pão”.
A resposta de
Amós deixa claro que o profeta é um homem livre, que não actua por interesses
humanos (próprios ou alheios), mas por mandato de Deus. A iniciativa de ser
profeta não foi sua… Deus é que veio ao seu encontro, interrompeu a normalidade
da sua vida e convocou-o para a missão. De resto, a profecia não é, para ele,
uma ocupação profissional, ou uma forma de realizar interesses pessoais. Amós é
profeta porque Deus irrompeu na sua vida com uma força irresistível, tomou
conta dele e enviou-o a Israel. O profeta não está, portanto, preocupado com os
interesses do rei ou com os interesses do sacerdote Amasias, ou com a
perpetuação de uma ordem social injusta e opressora… Ele foi convocado para ser
a voz de Deus e só lhe interessa cumprir a missão que Deus lhe confiou. Doa a
quem doer, é isso que Amós procurará fazer. Ele não pode, nem quer ficar
calado… A sua missão (ainda que isso custe a Amasias e ao rei) tem autoridade
por si própria, porque vem de Deus e Deus é infinitamente maior do que o rei.
Munido dessa autoridade (que não só o legitima na sua acção profética, mas até
o obriga a ser fiel à missão que lhe foi confiada), Amós anuncia (num
desenvolvimento que o texto que nos é proposto não conservou – cf. Am 7,16-17)
o castigo para o rei, para Amasias e para toda a nação infiel.
ACTUALIZAÇÃO
• Neste texto
– como em tantos outros textos proféticos – transparece a absoluta convicção de
que o profeta é um homem de Deus, escolhido por Deus, chamado por Deus, enviado
por Deus, legitimado por Deus. Deus está na origem da vocação profética; e a
actuação do profeta só faz sentido se partir de Deus e se tiver como objectivo
apresentar aos homens as propostas de Deus. É preciso que nós crentes –
constituídos profetas pelo Baptismo – tenhamos Deus como a referência de onde
parte e para onde se orienta a nossa acção e missão proféticas. Nenhum profeta
o é por sua iniciativa pessoal, ou para anunciar propostas pessoais; mas é Deus
que nos chama, que nos envia e que está na base desse testemunho que somos
chamados a dar no meio dos homens.
• O profeta é
um homem livre, que não se amedronta nem se dobra face aos interesses dos
poderosos. Por isso, o profeta não pode calar-se perante a injustiça, a
opressão, a exploração, tudo o que rouba a vida e impede a realização plena do
homem. Amasias – o sacerdote que alinha ao lado dos poderosos, que defende
intransigentemente a ordem estabelecida, que se compromete com ela, que vende a
sua consciência para manter o lugar e que transige com a injustiça para não
incomodar os poderosos – é um exemplo a não seguir… Amós, o profeta que não se
cala nem se vende, que está disposto a arriscar tudo (inclusive a própria vida)
para defender os pequenos e os fracos e que não hesita em propor os projectos
de Deus para o homem e para o mundo, deve ser o modelo para qualquer crente a
quem Deus chama a cumprir uma missão profética no meio do mundo.
• Amasias é o
homem comodamente instalado nos seus privilégios, benesses, que cala a voz da
própria consciência porque tem muito a perder e não quer arriscar; Amós é o
profeta livre da preocupação com os bens materiais, que não está preocupado com
a defesa dos próprios interesses, mas sim com a defesa intransigente dos
interesses dos pobres e marginalizados, que são os interesses de Deus. A
diferença entre os dois é a diferença entre aquele para quem os valores
materiais são a prioridade fundamental e aquele para quem os valores de Deus
são a prioridade fundamental. O verdadeiro profeta não pode colocar os bens
materiais como a sua prioridade fundamental; se isso acontecer, perderá a sua
liberdade profética e tornar-se-á um escravo de quem lhe paga.
• Este texto
fala-nos também da promiscuidade entre a religião e o poder. Trata-se de uma
combinação que não produz bons frutos (como, aliás, a história da Igreja tem
demonstrado nas mais diversas épocas e lugares). A Igreja, para poder exercer
com fidelidade a sua missão profética, tem de evitar colar-se aos poderosos e
depender deles, sob pena de ser infiel à missão que Deus lhe confiou. Uma
Igreja que está preocupada em não incomodar o poder para manter privilégios
fiscais, ou para continuar a receber dinheiro para as instituições que tutela,
será uma Igreja escrava, de mãos atadas, dependente, que está longe de Jesus
Cristo e da sua proposta libertadora.
SALMO
RESPONSORIAL – Salmo 84 (85)
Refrão 1:
Mostrai-nos, Senhor, o vosso amor
e dai-nos a vossa salvação.
Refrão 2:
Mostrai-nos, Senhor, a vossa misericórdia.
Deus fala de
paz ao seu povo e aos seus fiéis
e a quantos de
coração a Ele se convertem.
A sua salvação
está perto dos que O temem
e a sua glória
habitará na nossa terra.
Encontraram-se
a misericórdia e a fidelidade,
abraçaram-se a
paz e a justiça.
A fidelidade
vai germinar da terra
e a justiça
descerá do Céu.
O Senhor dará
ainda o que é bom,
e a nossa
terra produzirá os seus frutos.
A justiça
caminhará à sua frente
e a paz
seguirá os seus passos.
LEITURA II –
Ef 1,3-14
Leitura da
Epístola do apóstolo São Paulo aos Efésios
Bendito seja
Deus, Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo,
que do alto
dos Céus nos abençoou
com toda a
espécie de bênçãos espirituais em Cristo.
N’Ele nos
escolheu, antes da criação do mundo,
para sermos
santos e irrepreensíveis,
em caridade,
na sua presença.
Ele nos
predestinou, de sua livre vontade,
para sermos
seus filhos adoptivos, por Jesus Cristo,
para que fosse
enaltecida a glória da sua graça,
com a qual nos
favoreceu em seu amado Filho.
N’Ele, pelo
seu sangue,
temos a
redenção, a remissão dos pecados.
Segundo a
riqueza da sua graça,
que Ele nos
concedeu em abundância,
com plena
sabedoria e inteligência,
deu-nos a
conhecer o mistério da sua vontade:
segundo o
beneplácito que n’Ele de antemão estabelecera,
para se
realizar na plenitude dos tempos:
instaurar
todas as coisas em Cristo,
tudo o que há
nos Céus e na terra.
Em Cristo
fomos constituídos herdeiros,
por termos
sido predestinados,
segundo os
desígnios d’Aquele que tudo realiza
conforme a
decisão da sua vontade,
para servir à
celebração da sua glória,
nós que desde
o começo esperámos em Cristo.
Foi n’Ele que
vós também,
depois de
ouvirdes a palavra da verdade,
o Evangelho da
vossa salvação,
abraçastes a
fé e fostes marcados pelo Espírito Santo prometido,
que é o penhor
da nossa herança,
para a
redenção do povo que Deus adquiriu
para louvor da
sua glória.
AMBIENTE
A cidade de
Éfeso, capital da Província romana da Ásia, estava situada na costa ocidental
da Ásia Menor. O seu importante porto e a sua numerosa população faziam dela uma
cidade florescente. Paulo passou em Éfeso na sua segunda viagem missionária
(cf. Act 18,19-21) e, durante a sua terceira viagem missionária, fez de Éfeso o
quartel-general, a partir do qual evangelizou toda a zona ocidental da Ásia
Menor.
A nossa Carta aos
Efésios é, provavelmente, um dos exemplares de uma “carta circular” enviada a
várias igrejas da Ásia Menor, numa altura em que Paulo está na prisão
(em Cesareia? Em Roma?). O seu portador é um tal Tíquico.
Alguns vêem
nesta carta uma espécie de síntese da teologia paulina, numa altura em que a
missão do apóstolo está praticamente terminada no oriente. O tema mais
importante da carta aos Efésios é aquilo que o autor chama “o mistério”:
trata-se do projecto salvador de Deus, definido e elaborado desde sempre,
escondido durante séculos, revelado e concretizado plenamente em Jesus,
comunicado aos apóstolos e, nos “últimos tempos”, tornado presente no mundo
pela Igreja.
O texto que
nos é hoje proposto aparece no início da carta. É um hino litúrgico que deve ter
circulado nas comunidades cristãs antes de ser enxertado aqui por Paulo. Este
hino dá graças pela acção do Pai (cf. Ef 1,3-6), do Filho (cf. Ef 1,7-12) e do
Espírito Santo (cf. Ef 1,13-14), no sentido de oferecer aos homens a salvação.
MENSAGEM
A acção de
graças dirige-se a Deus, pois Ele é a fonte última de todas as graças
concedidas aos homens. Essas graças atingiram os homens através do Filho, Jesus
Cristo.
Qual é então,
segundo este hino, a acção do Pai?
O Pai, no seu
amor, elegeu-nos desde sempre (“antes da criação do mundo”). Elegeu-nos para
quê? A resposta é: “para sermos santos e irrepreensíveis”. A palavra “santo”
indica a situação de alguém que foi separado do mundo e consagrado a Deus, para
o serviço de Deus; a palavra “irrepreensível” era usada para falar das vítimas
oferecidas em sacrifício a Deus, que deviam ser imaculadas e sem defeito…
Significa, pois, uma santidade (isto é, uma consagração a Deus) verdadeira e
radical.
Além de nos
eleger, o Pai predestinou-nos “para sermos seus filhos adoptivos”. Através de
Cristo, o Pai ofereceu-nos a sua vida e integrou-nos na sua família na
qualidade de filhos. O fim desta acção de Deus é o louvor da sua glória.
“Eleição” e
“adopção como filhos” resultam do imenso amor de Deus pelos homens – um amor que
é gratuito, incondicional e radical.
E Jesus
Cristo, o Filho, que papel teve neste processo?
Nos vers.
7-10, o autor do hino refere-se ao sangue derramado de Cristo e ao seu
significado redentor. A morte de Jesus na cruz é o sinal evidente do espantoso
amor de Deus pelos homens; e dessa forma, Deus ensinou-nos a viver no amor, no
amor total e radical. Através de Cristo, Deus derramou sobre nós a sua graça,
tornando-nos pessoas novas e diferentes, capazes de viver no amor. Assim, Deus
manifestou-nos o seu projecto de salvação (que o hino chama “o mistério”) e que
consiste em levar-nos a uma identificação plena com Jesus (na sua ilimitada
capacidade de amar e de dar vida), a uma unidade e harmonia totais com Jesus.
Identificando-nos com Cristo e ensinando-nos a viver no amor total e radical,
Deus reconciliou-nos consigo, com todos os outros e com a própria natureza. Da
acção redentora de Cristo nasceu, pois, um Homem Novo, capaz de um novo tipo de
relacionamento (não marcado pelo egoísmo, pelo orgulho, pela auto-suficiência,
mas marcado pelo amor e pelo dom da vida) com Deus, com os outros homens e
mulheres e com toda a criação.
Dessa forma,
em Cristo fomos constituídos filhos de Deus e herdeiros da salvação, conforme o
projecto de Deus preparado desde toda a eternidade em nosso favor (vers.
11-12).
Os crentes que
aderiram a Jesus foram marcados pelo “selo” do Espírito. Esse “selo” é a marca
que atesta a nossa integração na família divina e a garantia de que um dia
participaremos na vida eterna, plena e verdadeira, conforme o plano que Deus
tem para nós (vers. 13-14).
ACTUALIZAÇÃO
• O nosso
texto afirma, de forma clara, que Deus tem um projecto de vida plena e total
para os homens, um projecto que desde sempre esteve na mente de Deus. É muito
importante termos isto em conta: não somos um acidente de percurso na evolução
inexorável do cosmos, mas somos actores principais de uma história de amor que
o nosso Deus sempre sonhou e que Ele quis escrever e viver connosco… No meio
das nossas desilusões e dos nossos sofrimentos, da nossa finitude e do nosso
pecado, dos nossos medos e dos nossos dramas, não esqueçamos que somos filhos
amados de Deus, a quem Ele oferece continuamente a vida definitiva, a
verdadeira felicidade.
• De acordo
com o nosso texto, Deus “elegeu-nos… para sermos santos e irrepreensíveis”. Já
vimos que “ser santo” significa ser consagrado para o serviço de Deus. O que é
que isto implica em termos concretos? Entre outras coisas, implica tentar
descobrir o plano de Deus, o projecto que Ele tem para cada um de nós e
concretizá-lo dia a dia com verdade, fidelidade e radicalidade. No meio das
solicitações do mundo e das exigências da nossa vida profissional, social e
familiar, temos tempo para Deus, para dialogar com Ele e para tentar perceber
os seus projectos e propostas? E temos disponibilidade e vontade de concretizar
as suas propostas, mesmo quando elas não são conciliáveis com os nossos
interesses pessoais?
• O nosso
texto afirma ainda a centralidade de Cristo nesta história de amor que Deus
quis viver connosco… Jesus veio ao nosso encontro, cumprindo com radicalidade a
vontade do Pai e oferecendo-Se até à morte para nos ensinar a viver no amor.
Como é que assumimos e vivemos essa proposta de amor que Jesus nos apresentou?
Aprendemos com Ele a amar sem excepção e com radicalidade? Somos profetas que
testemunham, diante do mundo, o projecto de Deus? Aqueles que caminham pelo
mundo ao nosso lado encontram nos nossos gestos e atitudes sinais vivos do amor
de Deus revelado em Jesus?
ALELUIA – cf.
Ef 1,17-18
Aleluia.
Aleluia.
Deus, Pai de
Nosso Senhor Jesus Cristo,
ilumine os
olhos do nosso coração,
para sabermos
a que esperança fomos chamados.
EVANGELHO – Mc
6,7-13
Evangelho de
Nosso Senhor Jesus Cristo segundo São Marcos
Naquele tempo,
Jesus chamou
os doze Apóstolos
e começou a
enviá-los dois a dois.
Deu-lhes poder
sobre os espíritos impuros
e ordenou-lhes
que nada levassem para o caminho,
a não ser o
bastão:
nem pão, nem
alforge, nem dinheiro;
que fossem
calçados com sandálias,
e não levassem
duas túnicas.
Disse-lhes
também:
«Quando
entrardes em alguma casa,
ficai nela até
partirdes dali.
E se não
fordes recebidos em alguma localidade,
se os
habitantes não vos ouvirem,
ao sair de lá,
sacudi o pó dos vossos pés
como
testemunho contra eles».
Os Apóstolos
partiram e pregaram o arrependimento,
expulsaram
muitos demónios,
ungiram com
óleo muitos doentes e curaram-nos.
AMBIENTE
Toda a
primeira parte do Evangelho segundo Marcos (cf. Mc 1,14-8,30) está montada à
volta da ideia de que Jesus é o Messias que proclama o Reino de Deus. Como
ponto de partida está um sumário-anúncio inicial (cf. Mc 1,14-15) onde se
proclama a chegada do Reino; em seguida, Jesus apresenta a proposta do Reino a
um grupo de discípulos, que escutam o apelo e aceitam embarcar na aventura do
Reino de Deus (cf. Mc 1,16-20); depois, Marcos descreve como Jesus, com
palavras e com gestos concretos, vai propondo essa nova realidade que é o Reino
e vai intercalando as propostas de Jesus com as respostas positivas ou
negativas dos fariseus, do povo e dos próprios discípulos (cf. Mc 1,21-8,30).
À medida que o
“caminho do Reino” avança, os discípulos vão aparecendo cada vez mais ligados a
Jesus e cada vez mais implicados no projecto do Reino. Chamados por Jesus, eles
responderam positivamente a esse chamamento e seguiram-n’O; depois, durante a
caminhada que fizeram com Jesus, eles escutaram os ensinamentos de Jesus e
testemunharam os seus gestos e sinais. Formados por Jesus na “escola do Reino”,
os discípulos podem agora ser enviados ao mundo, a fim de anunciar a todos os
homens a chegada desse mundo novo que Jesus chamava o “Reino de Deus”.
MENSAGEM
O nosso texto
é uma autêntica catequese sobre a missão dos discípulos de Jesus no meio do
mundo. As instruções postas aqui na boca de Jesus conservam o seu sentido e
valor para os discípulos de todo o tempo e lugar.
Marcos começa
por deixar claro que a iniciativa do chamamento dos discípulos é de Jesus: Ele
“chamou-os” (vers. 7). Não há qualquer explicação sobre os critérios que
levaram a essa escolha: falar de vocação e de eleição é falar de um mistério
insondável, que depende de Deus e que o homem nem sempre consegue compreender e
explicar.
Depois, Marcos
aponta o número dos discípulos que são enviados (“doze”). Porquê exactamente
“doze”? Trata-se de um número simbólico, que lembra as doze tribos que formavam
o antigo Povo de Deus. Estes “doze” discípulos representam simbolicamente a
totalidade do Povo de Deus, do novo Povo de Deus. É a totalidade do Povo de
Deus que é enviada em missão.
Os “doze” são
enviados “dois a dois”. É provável que o envio “dois a dois” tenha a ver com o
costume judaico de viajar acompanhado, para ter ajuda e apoio em caso de
necessidade; pode também pensar-se que esta exigência de partir em missão “dois
a dois” tenha a ver com as exigências da lei judaica, de acordo com a qual eram
necessárias duas testemunhas para dar credibilidade a um qualquer anúncio (cf.
Dt 19,15; Mt 18,16). Em qualquer caso, a exigência de partir em missão “dois a
dois” sugere também que a evangelização tem sempre uma dimensão comunitária. Os
discípulos nunca devem trabalhar sós, à margem do resto da comunidade; não
devem anunciar as suas ideias, mas a fé da Igreja. Quem anuncia o Evangelho,
anuncia-o em nome da comunidade; e o seu anúncio deve estar em sintonia com a
fé da comunidade.
Em seguida,
Marcos define a missão que Jesus lhes confiou (“deu-lhes poder sobre os
espíritos impuros). Os espíritos impuros representam aqui tudo aquilo que
escraviza o homem e que o impede de chegar à vida em plenitude. A missão
dos discípulos é, pois, lutar contra tudo aquilo – seja de carácter físico,
seja de carácter espiritual – que destrói a vida e a felicidade do homem
(podemos dizer que a missão dos discípulos é lutar contra o “pecado”). É da
acção libertadora dos discípulos (que actuam por mandato de Jesus) que nasce um
mundo novo, de homens livres – o mundo do “Reino”.
Em seguida,
vêm as instruções para a missão (vers. 8-9). Na perspectiva de Jesus, os
discípulos devem partir para a missão, num despojamento total de todos os bens
e seguranças humanas… Podem levar um cajado (na versão de Mateus e de Lucas, os
discípulos não deviam levar cajado – cf. Mt 10,10; Lc 9,3); mas não devem levar
nem pão, nem alforge, nem moedas (essas pequenas moedas de cobre que o viajante
levava sempre consigo para as suas pequenas necessidades), nem duas túnicas. Os
discípulos devem ser totalmente livres e não estar amarrados a bens materiais;
caso contrário, a preocupação com os bens materiais pode roubar-lhes a
liberdade e a disponibilidade para a missão. Por outro lado, essa atitude de
pobreza e de despojamento ajudará também os discípulos a perceber que a
eficácia da missão não depende da abundância dos bens materiais, mas sim da
acção de Deus. Finalmente, a sobriedade e o desapego são sinais de que o
discípulo confia em Deus e contribuem para dar credibilidade ao testemunho.
Um outro
género de instruções refere-se ao comportamento dos discípulos diante da
hospitalidade que lhes for oferecida (vers. 10-11). Quando forem acolhidos numa
casa, devem aí permanecer algum tempo (seguramente para formar uma comunidade)
e não devem saltar de um lugar para o outro, ao sabor das amizades, dos
interesses próprios ou alheios ou das suas próprias conveniências pessoais.
Quando não forem recebidos num lugar, devem “sacudir o pó dos pés” ao abandonar
esse lugar: trata-se de um gesto que os judeus praticavam quando regressavam do
território pagão e que simboliza a renúncia à impureza. Aqui, deve significar o
repúdio pelo fechamento às propostas libertadoras de Deus.
Finalmente,
Marcos descreve a realização da missão dos discípulos (vers. 12-13): pregavam a
conversão (“metanoia” – isto é, uma mudança radical de mentalidade, de valores,
de atitudes, um voltar-se para Jesus Cristo e um acolher o seu projecto), expulsavam
demónios, curavam os doentes. Trata-se de continuar a missão de Jesus: libertar
o homem de tudo aquilo que o oprime e lhe rouba a vida, para fazer aparecer um
mundo de homens livres e salvos (“Reino de Deus”).
O anúncio que
é confiado aos discípulos é o anúncio que Jesus fazia (o “Reino”); os gestos
que os discípulos são convidados a fazer para anunciar o “Reino” são os mesmos
que Jesus fez. Ao apresentar a missão dos discípulos em paralelo e em absoluta
continuidade com a missão de Jesus, Jesus convida a Igreja (os discípulos) a
continuar na história a obra libertadora que Ele começou em favor do homem.
ACTUALIZAÇÃO
• Como é que
Deus age, hoje, no mundo? A resposta que o Evangelho deste domingo dá é:
através desses discípulos que aceitaram responder positivamente ao chamamento
de Jesus e embarcaram na aventura do “Reino”. Eles continuam hoje no mundo a
obra de Jesus e anunciam – com palavras e com gestos – esse mundo novo de
felicidade sem fim que Deus quer oferecer aos homens.
• Atenção:
Jesus não chama apenas um grupo de “especialistas” para o seguir e para dar
testemunho do “Reino”. Os “doze” representam a totalidade do Povo de Deus. É a
totalidade do Povo de Deus (os “doze”) que é enviada, a fim de continuar a obra
de Jesus no meio dos homens e anunciar-lhes o “Reino”. Tenho consciência de que
isto me diz respeito e que eu pertenço à comunidade que Jesus envia em missão?
• Qual é a
missão dos discípulos de Jesus? É lutar objectivamente contra tudo aquilo que
escraviza o homem e que o impede de ser feliz. Hoje há estruturas que geram
guerra, violência, terror, morte: a missão dos discípulos de Jesus é
contestá-las e desmontá-las; hoje há “valores” (apresentados como o “último
grito” da moda, do avanço cultural ou científico) que geram escravidão,
opressão, sofrimento: a missão dos discípulos de Jesus é recusá-los e
denunciá-los; hoje há esquemas de exploração (disfarçados de sistemas
económicos geradores de bem estar) que geram miséria, marginalização,
debilidade, exclusão: a missão dos discípulos de Jesus é combatê-los. A
proposta libertadora de Jesus tem de estar presente (através dos discípulos) em
qualquer lado onde houver um irmão vítima da escravidão e da injustiça. É isso
que eu procuro fazer?
• As
advertências de Jesus para que os discípulos se apresentem sempre numa atitude
de sobriedade e de despojamento significam, em primeiro lugar, que o discípulo
nunca deve fazer dos bens materiais a sua prioridade fundamental. Se o
discípulo estiver obcecado pelo “ter”, tornar-se-á escravo dos bens,
acomodar-se-á e não terá espaço nem disponibilidade para se lançar na aventura
do anúncio do Reino. Por outro lado, o discípulo que erige os bens materiais
como a prioridade da sua vida sentirá sempre a tentação de se calar, de não
incomodar os poderosos, a fim de preservar os seus interesses económicos e os
seus benefícios particulares.
• As
advertências de Jesus para que os discípulos se apresentem sempre numa atitude
de sobriedade e de despojamento significam também o desapego das ideias e
preconceitos, dos hábitos e costumes, das paixões e afectos que podem
constituir um obstáculo para a missão de anunciar o Reino.
• As palavras
de Jesus recomendam ainda aos discípulos que actuam por um tempo prolongado num
determinado lugar, a moderação e o agradecimento para com aqueles que os
acolhem. Quem é recebido numa casa ou num lugar como hóspede, deve converter-se
numa bênção para essa casa e comportar-se com sobriedade, equilíbrio e
maturidade.
• Com
frequência os discípulos de Jesus têm de lidar com a oposição e a recusa da
proposta que eles testemunham. É um facto que deve ser visto com normalidade e
compreensão. No entanto, quando isto suceder, é missão dos discípulos alertar
os implicados para a gravidade da recusa. Quem recusa as propostas de Deus, deve
estar plenamente consciente de que está a perder oportunidades únicas e a
afastar-se da sua realização plena, da vida verdadeira.
ALGUMAS
SUGESTÕES PRÁTICAS PARA O 15º DOMINGO DO TEMPO COMUM
(adaptadas de
“Signes d’aujourd’hui”)
Ao longo dos
dias da semana anterior ao 15º Domingo do Tempo Comum, procurar meditar a
Palavra de Deus deste domingo. Meditá-la pessoalmente, uma leitura em cada dia,
por exemplo… Escolher um dia da semana para a meditação comunitária da Palavra:
num grupo da paróquia, num grupo de padres, num grupo de movimentos eclesiais,
numa comunidade religiosa… Aproveitar, sobretudo, a semana para viver em pleno
a Palavra de Deus.
2. BILHETE DE
EVANGELHO.
Testemunho do
“nós”… Jesus envia os discípulos dois a dois. Ele sabe que a sua missão será
difícil de cumprir. Mesmo Ele, Jesus, fez-Se acompanhar de uma equipa. O
testemunho é sempre um “nós” para nunca se falar em nome próprio mas, com
outros, em nome daquele que envia. Algumas recomendações a estes peregrinos da
Boa Nova: contar apenas com Deus; pôr-se a caminho para se fazer peregrino;
aceitar a hospitalidade para se apresentar como um pobre; não forçar as portas
para respeitar a liberdade. Quanto à mensagem a proclamar, é a mensagem do Mestre:
“convertei-vos!” E quanto aos actos, são os mesmos de Jesus: expulsar os
demónios e curar os doentes. Decididamente, o servo não é maior do que o seu
mestre, e o enviado faz sempre referência àquele que o envia. Hoje, o “nós” é o
da Igreja. Oxalá ela possa contar apenas com Deus, fazer-se peregrina,
apresentar-se pobre, respeitar a liberdade dos homens…
3. À ESCUTA DA
PALAVRA.
Testemunhas do
amor de Deus… “Jesus chamou os doze Apóstolos e começou a enviá-los dois a
dois. Deu-lhes poder sobre os espíritos impuros”. O apelo dos Apóstolos está
ligado ao seu envio, à sua missão. Serem os companheiros de Jesus, não para
ficarem abrigados perto d’Ele, mas para serem enviados comos suas testemunhas
até aos confins da terra. Ele envia-os dois a dois. Sem dúvida, porque na
altura um testemunho só era reconhecido como autêntico se levado por duas
testemunhas. Mas, mais profundamente, Jesus veio para colocar os homens na
“circulação do amor”. Deus criou os homens para serem à sua imagem. Como “Deus
é Amor”, os homens serão imagens de Deus na medida em que construírem juntos
relações de amor fraterno. Ora, eles recusaram isso. O espírito do mal é
chamado de diabo, aquele que divide em vez de unir. Jesus veio para acabar com
a divisão. Ele é aquele que reconcilia os homens com Deus e entre si. Eis
porque Jesus envia os Apóstolos dois a dois: para que sejam primeiramente, pelo
seu comportamento e pela sua vida, testemunhas desta obra de reconciliação. A
salvação nunca é individual, é colocada na relação dos homens entre si, no
movimento de amor de Deus. A missão dos Apóstolos é, pois, de lutar contra o
mal que divide e corrompe. Então, compreendemos melhor porque Jesus dá
conselhos de pobreza. Encher-se de riquezas materiais é arriscar cair na
armadilha da possessão egoísta, é entrar no círculo infernal da vontade de
poder, da inveja. É centrar-se sobre si mesmo em lugar de dar lugar aos outros.
É obscurecer o seu olhar interior e não ser mais suficientemente disponível
para acolher o outro. É sempre válido para todos os baptizados cuja missão é
serem testemunhas da Boa Nova no coração do mundo!
4. PARA A
SEMANA QUE SE SEGUE…
Bendizer no
quotidiano… Em cada dia desta semana, dirigir ao Senhor uma curta oração de
bênção: para a felicidade partilhada nesse dia, para um encontro enriquecedor,
para uma refeição partilhada e cheia de amizade, para a beleza da Criação, para
um nascimento ou a alegria das crianças, etc.
UNIDOS PELA
PALAVRA DE DEUS
PROPOSTA PARA
ESCUTAR,
PARTILHAR, VIVER E ANUNCIAR A PALAVRA NAS COMUNIDADES DEHONIANAS
Grupo
Dinamizador:
P. Joaquim
Garrido, P. Manuel Barbosa, P. José Ornelas Carvalho
Província
Portuguesa dos Sacerdotes do Coração de Jesus (Dehonianos)
Rua Cidade de
Tete, 10 – 1800-129 LISBOA – Portugal
Tel. 218540900
– Fax: 218540909
Roteiro Homilético 3: Vida Pastoral
Aíla Luzia
Pinheiro Andrade, nj
Chamados e
enviados para proclamar a conversão
I. Introdução
geral
Deus, com
absoluta liberdade, chama todos e cada um em particular. Isso
significa que ele não faz acepção de pessoas, mas todos são vocacionados à
filiação divina, suprema vocação humana, embora haja distintas missões,
conforme os desígnios de Deus. Para o exercício do anúncio do evangelho,
algumas coisas são exigidas dos enviados e dos destinatários. Dos primeiros se
exige que renunciem aos interesses egoístas e se dediquem com afinco à
proclamação do reino, mesmo que o missionário se torne malquisto ou rejeitado.
Exemplo disso é Amós, que não falou palavras agradáveis e não buscou os
próprios interesses. Dos destinatários da missão se requer a acolhida ao
missionário como enviado de Deus e a docilidade à palavra divina por ele
proclamada.
II. Comentário
dos textos bíblicos
Evangelho (Mc
6,7-13): Chamou os Doze e os enviou dois a dois
Esse trecho do
Evangelho de Marcos nos insere no âmago da vocação da Igreja, que é ser
missionária.
A comunidade,
representada pelos Doze, é formada pelos discípulos seguidores de Jesus, que
participam da vida e missão de seu mestre. São seguidores porque foram
convocados por Jesus para segui-lo e a ele responderam afirmativamente. Isso
significa que a vocação cristã não se fundamenta em méritos pessoais, mas
unicamente no amor e na gratuidade de Deus, por meio de Jesus, e no
consentimento humano.
Uma vez
chamados, os discípulos são enviados a serviço da transformação deste mundo em
um reino de fraternidade e paz. Jesus os envia com o mesmo poder e autoridade
porque o discípulo participa da missão do Mestre, assumindo seu estilo de vida
e seu destino. Esse poder e autoridade estão a serviço do anúncio do reino, não
são para benefício próprio. O poder sobre os espíritos impuros ou sobre
enfermidades significa que o reino de Deus se expande enquanto o reino da morte
e do pecado cede espaço. Não há nenhum poder mágico, mas a ação de Deus que
destrói o poder das trevas quando a luz de Cristo é levada aos povos.
O envio de
dois em dois é muito importante, por causa do apoio mútuo e da deliberação a
respeito da melhor forma de evangelizar em cada local, ressaltando assim o
sentido da vida em
comunidade. Isso também mostra que os discípulos estavam de
acordo a respeito do conteúdo da mensagem, o que evitava possíveis
desconfianças nos ouvintes, pois naquela época havia muitos charlatães
prometendo felicidade em troca de benefícios.
A missão dos
Doze exige empenho, que se traduz principalmente em despojamento: não lhes é
permitido levar nada do que geralmente se levava numa viagem, para que a
provisão viesse de quem os acolhesse. Não se preocupando em levar pão, não
cobravam nada para poder comprá-lo. Apenas sandálias foram permitidas, porque
teriam longo caminho a trilhar. Além das sandálias, um só bastão para se
defender das feras. Por conta da urgência do anúncio, não deviam perder tempo
com quem rejeitasse a mensagem. Dessa forma, o anúncio chegaria com rapidez e
eficácia àqueles que o acolhessem com fé.
I leitura (Am
7,12-15): Vai, profetiza para meu povo
Na primeira
leitura, o sacerdote Amasias pensa que o profeta Amós usa a religião para
ganhar dinheiro. O sacerdote se sente incomodado com as profecias de Amós e
tenta persuadi-lo a ir embora, aconselhando-o a ganhar dinheiro em outro lugar,
pois ali é Betel, santuário real, e as críticas do profeta não são nada
agradáveis ao rei. Amós informa que não pertence a nenhum grupo de “profetas”,
como eram chamados os conselheiros dos reis. Ele não usa a religião para ganhar
dinheiro, mas tem sua própria profissão.
Amós não
profetizava por decisão pessoal, ele apenas correspondeu ao chamado de Deus.
Não deu a si mesmo essa tarefa e, aliás, ela não era nada lucrativa para ele;
ao contrário, ao criticar o rei, o profeta poderia receber grandes represálias.
O que Amós estava fazendo nada mais era que obedecendo a uma ordem de Deus, que
o chamou e o enviou a profetizar para que Israel voltasse ao caminho que os antepassados
haviam percorrido com o Senhor durante toda a história da salvação. A mensagem
podia até não ser agradável, mas visava ao arrependimento e à conversão.
II leitura (Ef
1,3-14): Em Cristo Deus
nos chamou a ser seus filhos
A segunda
leitura de hoje nos apresenta a vocação humana, ou seja, o plano divino da
salvação para os seres humanos: abençoados em Cristo, escolhidos nele antes da
criação do mundo e designados para serem filhos de Deus. Esse grandioso
desígnio de salvação se realiza mediante Cristo na oferta de sua própria vida,
que nos redime do pecado e nos confere a sua graça. Mas isso não excluiu a
colaboração humana; ao contrário, exige fé e empenho pessoal para viver em santidade. Além
disso, essa sublime vocação humana demanda o anúncio da “palavra da verdade”,
isto é, o “evangelho da salvação”.
III. Pistas
para reflexão
– Os
vocacionados à missão recebem a instrução de nada levar na viagem a não ser o
estritamente necessário, pois Deus cuidará do sustento deles por meio da
hospitalidade oferecida aonde forem. A hospitalidade era um costume e até mesmo
uma lei universal na sociedade antiga. Lendas folclóricas asseguravam que os
deuses se disfarçavam de seres humanos para testar a hospitalidade das pessoas
e, caso não fossem acolhidos, podiam-se esperar severos castigos. A sociedade
moderna não oferece as mesmas condições e os mesmos costumes da sociedade
antiga, contudo permanece a orientação de Jesus a respeito do desprendimento
que cada vocacionado deve ter.
– É bom
ressaltar o exemplo de Amós, que tinha liberdade para dizer o que Deus lhe
ordenava, pois, se não dependia da religião para o próprio sustento, não sentia
a imposição de dizer somente as palavras que agradassem aos ouvintes. Também
Paulo é exemplo de abandono nas mãos de Deus.
– Pode-se
enfocar o exemplo do apóstolo Paulo, que reconhecia as próprias fraquezas e
limitações, consciente de que a missão só podia ser levada a termo porque Deus
o fortalecia e o capacitava.
– Deve-se
destacar também o papel da comunidade no êxito da missão. A hospitalidade dada
aos missionários na Antiguidade pode ser atualizada na sociedade moderna em
diversos atos que promovam o desenvolvimento da missão.
Aíla Luzia
Pinheiro Andrade, nj
Graduada em
Filosofia pela Universidade Estadual do Ceará e em Teologia pela Faculdade
Jesuíta de Filosofia e Teologia (Faje – BH), onde também cursou mestrado e
doutorado em
Teologia Bíblica. Atualmente , leciona na Faculdade Católica
de Fortaleza. É autora do livro Eis que faço novas todas as coisas – teologia
apocalíptica (Paulinas). E-mail: aylanj@gmail.com
Roteiro Homilético 4: Dom Henrique
Am 7,12-15
Sl 84
Ef 1,3-14
Mc 6,7-13
Hoje, a santa
Palavra que Deus nos dirige nos fala de duas realidades: nossa missão de
profetas e a mensagem de devemos comunicar.
Primeiro, a
vocação de profeta. Escutamos na primeira leitura como Amós não poderia se
calar. Ele mesmo reconhece: “Não sou profeta nem sou filho de profeta; sou
pastor de gado e cultivo sicômoros. O Senhor chamou-me, quando eu tangia o
rebanho, e o Senhor me disse: ‘Vai profetizar para Israel, meu povo!’” Amós não
era profeta profissional nem era de uma família tradicional de profetas. E, no
entanto, o Senhor o tirou de trás do rebanho, tirou-o da sua vida, e o mandou
falar em seu nome ao povo de Israel. No evangelho, vimos Jesus chamando os Doze
e os mandando em missão: sem levar nada, confiando somente em Deus, correndo o
risco de serem incompreendidos e rejeitados, eles deveriam ir, anunciando o
Reino de Deus, que exige mudança de vida, conversão de pensamento, atitudes e
modo de agir…
Meus caros,
ainda hoje é assim; entre nós é assim! Deus continua falando, Deus continua
escolhendo profetas, Deus continua dirigindo seu chamado ao mundo e a cada
pessoa. Se escutarmos com atitude de fé a Palavra santa, se na oração nos
abrirmos aos seus apelos, se estivermos atentos ao que ele nos fala no nosso
coração, descobriremos que o Senhor também nos envia! Isso mesmo: todo cristão,
pelo Batismo e a Crisma, participa da missão do Cristo Jesus, a missão de anunciar
o Reino de Deus, revelando a face do Pai, que Jesus nos veio mostrar! É verdade
que, na Igreja, há aqueles chamados para o ministério ordenado: Bispos, padres
e diáconos que, em nome de Cristo, apascentam o rebanho e anunciam o Evangelho.
Eles são os primeiros responsáveis pelo anúncio da Palavra de Deus. Mas, todo o
povo de Deus, todos os batizados e crismados, cada um de nós, tem a missão de
falar em nome do Senhor e, em nome de Cristo, levar a luz nas trevas, a paz nas
tensões e angústias, a esperança no desespero, a vida nova nas situações de
morte. Somos todos um povo de profetas, caríssimos e, se nos calarmos, se nos
omitirmos, seremos culpados de escondermos e sufocarmos a Palavra do Senhor de
que o mundo tanto necessita!
Aqui cabe um
urgente exame de consciência. Quantas oportunidades temos de falar de Cristo,
de anunciar a vontade e o plano de Deus, de dar testemunho do seu amor e da sua
presença – e nos calamos, nos omitimos, como se Cristo não fosse uma questão
nossa! Quantas vezes somos cristãos cansados, cristãos omissos, cristãos
comodistas! Os pais aqui presentes têm anunciado Jesus a seus filhos, têm sido
seus primeiros evangelizadores e catequistas? Têm rezado com eles? Têm
procurado lavá-los à Igreja? Marido e mulher, têm sido um para o outro um sinal
de Deus, uma palavra e uma presença de Cristo? Têm procurado construir o lar
como um sinal do Reino dos Céus? E os jovens cristãos, têm sido sinal de Nosso
Senhor no mundo em que vivem? Têm feito e vivido as várias experiências da vida
como discípulos de Cristo? Eis, meus caros irmãos! Não esqueçamos que nós somos
os profetas, nós somos os enviados do Senhor! É esta a primeira lição que hoje
a Palavra de Deus nos dá. No trabalho, no amor, no descanso, no estudo, nas
relações sociais somos as testemunhas do Senhor nosso! Um dia, certamente
seremos cobrados por isso; o Senhor nos pedirá contas!
Um segundo
aspecto para nossa meditação é o que diz São Paulo na segunda leitura. Aí ele
apresenta de modo maravilhoso aquilo que devemos comunicar ao mundo com a
palavra e com a vida, isto é, o conteúdo da nossa fé cristã, o grande sonho de
Deus para o mundo e para a humanidade. O que nos diz o Apóstolo? Diz-nos que
antes da criação do mundo, o Pai sonhou conosco! As montanhas ainda não
existiam, as estrelas ainda não brilhavam e o Pai, em Cristo, já sonhava em
criar tudo, em nos criar – a mim e a você – e nos mandar o seu Filho amado. Por
ele, o Pai criou tudo, por ele, na força do Santo Espírito, o Pai, desde o
princípio, cumulou de bênçãos a sua criação. Seu maior sonho era nos mandar
Jesus, o Filho feito um de nós, para que ele nos levasse à plenitude da amizade
com o Pai na potência do Espírito. E quando nós pecamos, quando a humanidade,
desde o princípio, fechou-se para Deus e para o seu sonho, o Pai nem assim
desistiu do seu amor: na plenitude dos tempos ele enviou o seu Cristo para que,
morrendo na cruz, ele nos libertasse do nosso pecado de teimosia e fechamento
e, enchendo-nos do seu Espírito Santo, nos desse já o gostinho, as primícias da
vida eterna. Essa vida, nós já a experimentamos aqui, em Jesus, ouvindo sua
Palavra, convivendo com os irmãos como membros da Santa Igreja e, sobretudo,
participando dos santos sacramentos, de modo especial da Eucaristia, que é Pão
do céu, alimento que nos traz já o sabor da vida de Deus.
Eis,
caríssimos! Somos enviados por Jesus ao mundo para testemunhar o plano, o sonho
de amor para toda a humanidade, que o Pai desde toda eternidade acalentou e
realizou em Cristo Jesus ,
tornando-o presente para nós pelo ministério da Igreja! Estejamos certos de uma
coisa: somos parte desse sonho, somos cooperadores desse sonho! Que nossa vida,
nossas palavras, nosso compromisso, testemunhem tornem presente esse sonho
lindo de Deus!
Olhemos a
cruz, conseqüência do nosso pecado, e tomemos consciência do quanto somos caros
a Deus, do quanto somos preciosos, do quanto somos amados e do quanto somos
chamados a amá-lo e participar da obra de salvação do mundo!
É esta a
mensagem deste Domingo, é este o apelo do Senhor! Não sejamos surdos, mas como
Amós, como os Doze primeiros, sejamos sementes do Reino de Deus. Amém.
Roteiro Homilético 5: Dom Total
JESUS ENVIA
SEUS MENSAGEIROS
1ª leitura: (Am 7,12-15) Missão do profeta – A
gente não se faz profeta: Deus é que chama, mesmo a quem aparentemente não está
preparado. Foi o caso de Amós, pastor e agricultor, que lembra isso quando o
sacerdote de Betel (em Israel), farto de suas críticas, o quer mandar de volta
a sua terra, Judá. * 7,12-13 cf. 1Sm 9,9; 1Rs 12,28-30 * 7,14-15 cf. Am 3,3-8;
2Sm 7,8.
2ª leitura:
(Ef 1,3-14 ou 1,3-10) Deus nos chamou à santidade e à unidade em Cristo – A
Carta aos Efésios caracteriza-se pela visão fundamental e abrangente do
mistério da salvação. Inicia com um hino de louvor, que resume todos o agir de
Deus no conceito de “bênção”. A vontade de Deus visa, em última instância, o
“louvor da glória de sua graça”, ou seja, que todo o mundo possa reconhecer sua
bondade (1,6; cf. 1,12.14). Esta abrange: nossa adoção filial, o perdão do
pecado, nossa participação de seu Reino e glória. Tudo isso, ele o opera
através de Cristo, Cabeça da criação. A garantia, já a recebemos no Espírito
que nos é dado (no batismo e na vida). * 1,3-6 cf. Gl 3,14; Jo 17,24; 1Pd 1,20;
Rm 8,29 * 1,7-12 cf. Cl 1,13-14; Rm 16,25; Fl 4,4; Cl 1,16.20 * 1,13-14 cf. Cl
1,5; Ef 4,30; Rm 5,5; 2Cor 1,22; 1Pd 2,9.
Evangelho: (Mc
6,7-13) Missão dos doze apóstolos – O Reino, tornado presente em Jesus, vai se
alastrando. Os “Doze” serão os mensageiros que, como antes João Batista, devem
provocar a conversão ao Evangelho anunciado por Jesus (6,12; cf. 1,4). Quem não
os acolhe, perde a chance (6,11). Segundo Mc (diferente de Mt 10,7 e Lc 9,2),
eles mesmos ainda não pregam o Reino, pois ainda não compreendem (8,14-21!).
Mas, apesar disso, já podem realizar os sinais do Reino (6,13),
entusiasmando-se muito com isso, como aparece na conclusão da missão, em 6,30
(entre o início e a conclusão, Mc insere, da maneira que lhe é característica,
o episódio da morte do Batista, porque a atividade de Jesus e dos apóstolos faz
Herodes lembrar-se de João). * Cf. Mt 10,1.9-14; Lc 9,16 * 6,7 cf. Mc 3,13-19;
6,30 * 6,13 cf. Tg 5,14.
*** ***
***
Num contexto
amplo que evoca a preparação dos discípulos, Jesus manda estes para uma missão
urgente, não permitindo que levem mais do que o estritamente necessário: um par
de sandálias e o bastão do profeta itinerante. Comparando com 2Rs 4,29 (a
pressa de Giezi, levando o bastão de Eliseu), temos a impressão de que se trata
de uma coisa de vida ou morte. (Esta pressa ficou melhor conservada ainda na
outra versão, em Lc 10,4: não devem entrar em casa de ninguém só para saudá-lo,
nem mesmo podem saudar alguém no caminho.) A efervescência da missão de Jesus,
anunciando a proximidade do Reino de Deus, teve esta característica: a última
chance!
Mc insiste,
porém, sobretudo na “imitação de Cristo”. Os apóstolos recebem dele
“autoridade” (assim como Eliseu, da parte de Elias: 2Rs 2,9-15) para curar,
exorcizar e fazer os sinais que ele fazia. Essa imitação inclui também o ser
rejeitado (Mc 6,11; cf. 6,1-6a, dom. pass.). Nesse caso, deverão sacudir o pó
de suas sandálias em testemunho contra a cidade que não os receber: a cidade
teve sua chance (cf. Ez 2,5; dom. pass.).
Neste ponto, o
evangelho tem ligação com a 1ª leitura: o profeta Amós, rejeitado pelo
sacerdote Amasias de Betel (em Israel, reino do Norte) e intimado a voltar a
sua região de origem, Judá (reino do Sul). As razões do sacerdote são
razoáveis; Amós parece um daqueles nabis profissionais, videntes carismáticos,
muitas vezes pouco fidedignos e desprezados pelo povo (cf. 1Sm 10,11). “Não,
diz Amós, eu não sou um vidente profissional, não viro a cabeça das pessoas
para ganhar dinheiro. Sou um homem com duas profissões bem honestas: pastor e
cultivador de sicômoros. Mas Deus é que me tirou de trás do rebanho e me forçou
a profetizar, fora de minha terra, em Israel”.
Amós pertence
a um novo tipo de profetas, não mais os tradicionais videntes, mas
representantes dos movimentos de renovação religiosa, dos quais o mais marcante
é o que produziu o livro do Deuteronômio. Eles se sabem enviados por Deus,
mesmo a regiões fora de sua jurisdição natural, com uma mensagem de conversão.
Conhecidos são os oráculos pouco reverentes de Amós contra a aristocracia de
Samaria (cf. a sequência da presente leitura: Am 7,16-17; ou as advertências às
senhoras de Samaria em Am 4). É este o tipo de missão que a liturgia de hoje
evoca, na 1ª leitura e no evangelho: uma advertência ao povo instalado, para
provocar sua conversão. Missão por iniciativa de Deus, muitas vezes contra a
vontade do próprio profeta, para denunciar e assim lograr conversão. Ora, no
Novo Testamento esta missão é acompanhada por sinais de benevolência, pois o
Reino que eles manifestam presente é um Reino de graça e misericórdia.
O enviado não
executa sua missão como ganha-pão. Deus revoluciona sua vida, porque tem uma
mensagem revolucionária a lhe confiar. Impelido por Deus, acolhido ou rejeitado
pelos homens, eis a vida do enviado, ao modelo de Jesus Cristo. Na Igreja, como
no antigo Israel, os porta-vozes oficiais transformaram, às vezes, a missão em ganha-pão. Mas cada
época da história da Igreja é marcada por movimentos de renovação profética,
para que se realize sempre de novo o que Paulo resume vigorosamente em 2Cor
5,14: “A caridade de Cristo nos impele”.
A 2ª leitura é
o rico início de Ef, resumindo a palavra que deve ser anunciada, o “evangelho”
de Paulo (1,13), como bênção de Deus em Jesus Cristo , eleição e vocação à santidade,
“projeto” (predestinação) de adoção filial, e tudo isso, graças ao sangue do
Cristo, que nos remiu. Ele remiu tudo para Deus; tudo é agora dele. Por isso, o
plano de Deus é: recapitular tudo em Cristo. Dando crédito à realidade anunciada no
evangelho (a “Palavra da Verdade”, 1,13), recebemos a garantia de Deus: seu
Espírito, penhor de nossa herança, antegosto daquilo que esperamos. É notável o
contraste entre a situação original da pregação de Jesus (a efervescência
apocalíptica da iminente irrupção do Reino) e a interpretação bem mais
espiritual da realidade escatológica em Ef. Há mais de trinta anos de distância;
dirige-se a outra cultura. Mas é substancialmente a mesma mensagem: não deixeis
escapar a realização da promessa.
EVANGELIZAR
Amós não era
profeta nem “filho de profeta” – termo bíblico para dizer discípulo (1ª
leitura). Não ganhava seu pão profetizando. Era pastor e agricultor. Tampouco
era cidadão da Samaria; era de Judá, que vivia em conflito com os samaritanos.
Mesmo assim, Deus o escolheu para dar um sério aviso ao sacerdote de Betel,
santuário da Samaria.
Tampouco eram
missionários profissionais os doze que Jesus enviou a anunciar a proximidade do
reino de Deus (evangelho). Estavam entregues à sua missão, à boa-nova que
deviam anunciar. Estavam entregues à hospitalidade das casas que encontrassem.
Recebiam, sim, de Deus, o poder de fazer uns discretos sinais, curas,
exorcismos. Nada deviam ter de si mesmos: nem dinheiro, nem roupa de reserva.
Só sandálias e um bom cajado para caminhar. Pois deviam avançar com pressa. O
tempo se cumpriu!
Na encíclica
Evangelii nuntiandi, o Papa Paulo VI escreveu que cada evangelizado deve ser
evangelizador. Se acreditamos na boa-nova do Reino, não a podemos esconder aos
nossos irmãos. Se acreditamos que a prática de Jesus inaugurou a salvação do
mundo e mostrou o caminho para todas as gerações, não podemos guardar isso para
nós. O mundo tem de ouvir isso. “Como poderão crer, se não ouvirem” (Rm 10,14).
Quem crê verdadeiramente, tem de evangelizar. Mas como?
Não precisa
ser especialista, capaz de discutir nas ruas e nas praças. Nem precisa de
treinamento para aprender a enrolar as pessoas ingênuas e tirar um “dízimo” ou
uma “aposta” de quem nem tem dinheiro para criar os seus filhos... Jesus deu
aos doze galileus poder de curar e de expulsar demônios. (Naquele tempo
chamava-se demônio qualquer doença inexplicável, sobretudo de ordem psíquica.)
Ou seja, Jesus lhes deu força para fazer bem ao povo ao qual anunciavam a
proximidade do Reino. Esses gestos eram um aperitivo do Reino. O bem que muitas
pessoas fazem em sua generosa simplicidade é um aperitivo do Reino de Deus. Já
tem o gostinho daquilo que chamamos o Reino – quando é feita a vontade do Pai,
como rezamos no Pai-Nosso.
A própria
prática do Reino é anúncio do Reino – provavelmente, o anúncio mais eficaz.
Vendo a prática do Reino, as pessoas vão perguntar o porquê: as “razões de
nossa esperança” (1Pd 3,15). Se nos comportarmos com simplicidade, entregues
àquilo em que acreditamos, ajudando onde pudermos – mas sem apoiarmos causas
erradas, estruturas injustas – o mundo perguntará que esperança está por trás
disso, que fé nos move, que amor nos envolve. Então responderemos: o amor que
aprendemos de Jesus, que deu sua vida por nós.
A palavra do
pregador será fidedigna, se acompanhada de uma prática que mostre o Reino... na
prática.
(O Roteiro Homilético é elaborado pelo Pe.
Johan Konings SJ – Teólogo, doutor em exegese bíblica, Professor da FAJE. Autor
do livro "Liturgia Dominical", Vozes, Petrópolis, 2003. Entre outras
obras, coordenou a tradução da "Bíblia Ecumênica" – TEB e a tradução
da "Bíblia Sagrada" – CNBB. Konings é Colunista do Dom Total.)
Roteiro Homilético 6: Roteiro
(http://www.presbiteros.com.br/)
RITOS INICIAIS
cf. Salmo 16,
15
ANTÍFONA DE
ENTRADA: Eu venho, Senhor, à vossa presença: ficarei saciado ao contemplar a
vossa glória.
Introdução ao
espírito da Celebração
Jesus sempre
apelou à conversão, não entendendo esta como uma questão meramente moral, mas
sim, como a transformação de nossa maneira de entender e viver a vida.
Converter-se não é tanto trocar algumas coisas que fazemos mas deixar de viver
a vida sem esperança, sem confiança na realidade da presença do Reino já entre
nós. Como entendo eu a conversão a que me chama Jesus? De que tenho de
converter-me?
Ao celebrarmos
o XV Domingo do Tempo Comum, possa o Senhor converter o nosso coração e
transformar-nos em profetas do Reino de Deus, um Reino paz, justiça e alegria.
ORAÇÃO
COLECTA: Senhor nosso Deus, que mostrais aos errantes a luz da vossa verdade
para poderem voltar ao bom caminho, concedei a quantos se declaram cristãos
que, rejeitando tudo o que é indigno deste nome, sigam fielmente as exigências
da sua fé. Por Nosso Senhor Jesus Cristo, vosso Filho que é Deus convosco na
unidade do Espírito Santo.
LITURGIA DA
PALAVRA
Primeira
Leitura
Monição: A
leitura do profeta Amós vem recordar-nos que a liberdade da fé deve ser
defendida perante qualquer poder político, para que, sem compromissos, possa
anunciar na íntegra o Evangelho.
Amós 7, 12-15
Naqueles dias,
12Amasias, sacerdote de Betel, disse a Amós: «Vai-te daqui, vidente. Foge para
a terra de Judá. Aí ganharás o pão com as tuas profecias. 13Mas não continues a
profetizar aqui em Betel, que é o santuário real, o templo do reino». 14Amós
respondeu a Amasias: «Eu não era profeta, nem filho de profeta. Era pastor de
gado e cultivava sicómoros. 15Foi o Senhor que me tirou da guarda do rebanho e
me disse: ‘Vai profetizar ao meu povo de Israel’».
A leitura é
tirada da 3ª parte do livro de Amós, «o ciclo das visões proféticas» (7, 1 – 9,
10). A visão do fio-de-prumo (7, 6-9) tinha denunciado a falta de rectidão e
corrupção que grassava no Reino do Norte, que se encontrava como uma parede
desaprumada, a ameaçar ruína iminente. O sacerdote Amasias, apaniguado do rei
Joroboão II, vê no profeta uma ameaça para a sua privilegiada situação e por
isso previne o rei contra o profeta que anunciava a sua morte e a destruição do
Reino do Norte (vv. 10-11) e dá ordens a Amós para que se retire para o Reino
de Judá (vv. 12-13), chamando-lhe «vidente», um outro nome dado aos profetas.
Amós confessa que era um simples trabalhador, mas que Deus inesperadamente o
chamou e enviou a profetizar (vv. 14-15): «Eu não era profeta nem filho de
profeta». Temos aqui a única alusão à sua vocação. Este texto deixa ver a
genuinidade do carisma profético de Amós, que não era um mero elemento dum
grupo profético, ou um profeta profissional ou cortesão, ao serviço dos homens.
Salmo
Responsorial Sl 84 (85), 9ab-10.11-12.13-14 (R. 8)
Monição: Junto
do Senhor encontra-se a misericórdia, a paz e a justiça. Supliquemos, pois, com
a confiança do Salmo 84: «Mostrai-nos, Senhor, o vosso amor e dai-nos a vossa
salvação»
Refrão:
MOSTRAI-NOS, SENHOR, O VOSSO AMOR
E DAI-NOS A
VOSSA SALVAÇÃO.
Ou:
MOSTRAI-NOS, SENHOR, A VOSSA MISERICÓRDIA.
Deus fala de
paz ao seu povo e aos seus fiéis
e a quantos de
coração a Ele se convertem.
A sua salvação
está perto dos que O temem
e a sua glória
habitará na nossa terra.
Encontraram-se
a misericórdia e a fidelidade,
abraçaram-se a
paz e a justiça.
A fidelidade
vai germinar da terra
e a justiça
descerá do Céu.
O Senhor dará
ainda o que é bom,
e a nossa
terra produzirá os seus frutos.
A justiça
caminhará à sua frente
e a paz
seguirá os seus passos.
Segunda
Leitura*
Monição: Para
Paulo estava claro que não só os judeus, mas também os gentios estavam em
Cristo, e participavam da bênção de Deus. A grande dificuldade do começo da
Igreja foi aceitar os gentios. Paulo esforçava-se por mostrar que os baptizados
também participavam da escolha, da graça e da iniciação no mistério de Deus.
* O texto
entre parêntesis pertence à forma longa e pode ser omitido.
*Forma longa:
Efésios 1, 3-14 Forma breve: Efésios 1, 3-10
3Bendito seja
Deus, Pai de Nosso Senhor Jesus Cristo, que do alto dos Céus nos abençoou com
toda a espécie de bênçãos espirituais em Cristo. 4N’Ele nos escolheu, antes da
criação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis, em caridade, na sua
presença. 5Ele nos predestinou, de sua livre vontade, para sermos seus filhos
adoptivos, por Jesus Cristo, 6para que fosse enaltecida a glória da sua graça,
com a qual nos favoreceu em seu amado Filho. 7N’Ele, pelo seu sangue, temos a
redenção, a remissão dos pecados. Segundo a riqueza da sua graça, 8que Ele nos
concedeu em abundância, com plena sabedoria e inteligência, 9deu-nos a conhecer
o mistério da sua vontade: segundo o beneplácito que n’Ele de antemão
estabelecera, 10para se realizar na plenitude dos tempos: instaurar todas as
coisas em Cristo, tudo o que há nos Céus e na terra.
[11Em Cristo
fomos constituídos herdeiros, por termos sido predestinados, segundo os
desígnios d’Aquele que tudo realiza conforme a decisão da sua vontade, 12para
servir à celebração da sua glória, nós que desde o começo esperámos em Cristo.
13Foi n’Ele que vós também, depois de ouvirdes a palavra da verdade, o
Evangelho da vossa salvação, abraçastes a fé e fostes marcados pelo Espírito
Santo prometido, 14que é o penhor da nossa herança, para a redenção do povo que
Deus adquiriu para louvor da sua glória.]
Este início da
epístola aos Efésios de que é extraída a leitura tem o aspecto de um hino
litúrgico e é uma das mais ricas sínteses doutrinais paulinas. A primeira parte
(vv. 3-10), exalta as bênçãos que encerra o projecto divino de salvação em
Cristo, por isso é chamda o benedictus paulino. Assim se exprime Bento XVI:
«Cada semana, a Liturgia das Vésperas apresenta à oração da Igreja o solene
hino de abertura da Carta aos Efésios… Pertence ao género das «berakot», ou
seja, as «bênçãos», que já aparecem no A. T. e que terão uma ulterior difusão
na tradição judaica. Trata-se, portanto, de uma constante cadeia de louvor
elevada a Deus, que na fé cristã é celebrado como «Pai de Nosso Senhor Jesus
Cristo»» (Audiência geral de 23-XI-2005).
3 «Em Cristo».
Toda a graça – «bênçãos espirituais» – que Deus concede ao homem, após o
pecado, é concedida pela mediação de Cristo e através da união com Ele.
4-5 «Santos».
«Filhos». O objectivo desta eleição eterna de Deus é «sermos santos», isto é,
destacados do profano e pecaminoso para servir ao culto e glória divina:
«diante d’Ele», isto é, na presença de Deus. Estamos chamados a estar sempre
diante de Deus para O glorificar a partir de tudo o que fazemos, dizemos ou
pensamos, como ensina o Concílio Vaticano II: «Todos os cristãos são, pois,
chamados e devem tender à santidade e perfeição do próprio estado» (LG 42). A
santidade está em sermos «participantes da natureza divina» (2 Pe 1, 4; Rom 12,
1), sendo filhos de Deus e vivendo como tais, imitando a Cristo, o Filho de
Deus por natureza (cf. Rom 8, 15-29; Gal 4, 5-7; 1 Jo 3, 1-3). A expressão «santos
e irrepreensíveis» faz pensar nas vítimas oferecidas a Deus no Antigo
Testamento (cf. Lv 20, 20-22), insinuando-se assim o carácter oblativo e
sacrificial de toda a vida do cristão (cf. 1 Pe 2, 5), bem como a perfeição que
devemos pôr em tudo o que fazemos; e não se trata duma pureza meramente
exterior e ritual, mas de um culto em espírito e verdade (cf. Jo 4, 23), «na
sua presença» (de Deus) «que examina os rins e o coração» (Salm 7, 10), isto é,
que perscruta o que há de mais íntimo no homem, a sua consciência, afectos e
intenções.
7 «Pelo seu
Sangue temos a Redenção». A salvação que Cristo nos traz não é uma mera
libertação; é apresentada como um resgate, uma remissão dos pecados (cf. Col 1,
14), que custou o Sangue de Cristo, a sua vida oferecida em sacrifício pelos
pecados (cf. Ef 1, 14; 1 Tes 5, 9; 1 Cor 6, 2; 7, 23; GaI 3, 13; 4, 5. 1 Pe 2,
9; 2 Pe 2, 1; Act 20, 28; Apoc 5, 9; 14, 3).
9 «O mistério
da sua vontade» é o plano redentor que Deus tem guardado para salvar todos os
homens: tendo permanecido oculto durante muito tempo, foi-nos revelado agora em
Cristo (cf. Col 1, 26).
10 «Instaurar
todas as coisas em Cristo», ou «Reunir sob a chefia de Cristo todas as coisas».
O verbo grego «anakêfalaiôsasthai», é de significação bastante discutida e difícil
de traduzir. Assim a Vulgata, preferiu o sentido de «instaurare omnia in
Christo», (tradução mantida na actual tradução litúrgica), decidindo-se pela
ideia de «restaurar todas as coisas», fazendo voltar ao princípio, à santidade
original toda a Criação transtornada pelo pecado (assim, à partícula aná que
entra na composição do verbo grego é dado um sentido iterativo). Porém outros,
apoiando-se no elemento central da palavra, «kêfaláion» – «resumo», «ponto
principal» –, traduzem por «concentrar ou reunir todas as coisas em Cristo»,
enquanto que Ele é o centro de convergência, o principio de unidade, ou o cume
de toda a Criação. Finalmente, outros, atendendo ao contexto (v. 22; 4, 15; 5,
23; Col 1, 18; 2, 10.19), onde Cristo é apresentado como «Cabeça», em grego,
«kêfalê», preferem traduzir por: «reunir sob a chefia de Cristo». Nesta linha
parece estar a Nova Vulgata ao traduzir «recapitulare». Entretanto, parece-nos
que o sentido literal não se fica somente no aspecto de fazer com que tudo
tenha a Cristo por Cabeça, mas que visa também o aspecto de reunir. Também a
tradução por «reunir sob a chefia de Cristo» não parece suficientemente
expressiva. Com efeito, todos os seres criados estão desconjuntados e desunidos
tanto entre si, como relativamente a Deus; pela Redenção de Cristo voltam a
unir-se entre si e com Deus, em Cristo, ao unirem-se a Cristo e ao serem
vivificados por Ele, constituído como cabeça de toda a Criação. A verdade é que
este primado e capitalidade de Cristo por enquanto só é universal «de direito»;
para que o seja «de facto» são os homens chamados a uma missão co-redentora,
esforçando-se por «pôr Cristo no cume de todas as actividades humanas, dando
forma a tudo segundo o espírito de Jesus, colocando Cristo no âmago de todas as
coisas» (S. Josemaria, Cristo que passa, n.º 105).
Aclamação ao
Evangelho cf. Ef 1, 17-18
Monição:
Começa uma nova etapa no processo do seguimento, a da missão. Agora cabe aos
Doze, proclamar o que viram e ouviram.
ALELUIA
CÂNTICO: J.
Duque, NRMS 21
Deus, Pai de
Nosso Senhor Jesus Cristo, ilumine os olhos do nosso coração,
para sabermos
a que esperança fomos chamados.
Evangelho
São Marcos 6,
7-13
Naquele tempo,
7Jesus chamou os doze Apóstolos e começou a enviá-los dois a dois. Deu-lhes
poder sobre os espíritos impuros 8e ordenou-lhes que nada levassem para o
caminho, a não ser o bastão: nem pão, nem alforge, nem dinheiro; 9que fossem
calçados com sandálias, e não levassem duas túnicas. 10Disse-lhes também:
«Quando entrardes em alguma casa, ficai nela até partirdes dali. 11E se não
fordes recebidos em alguma localidade, se os habitantes não vos ouvirem, ao
sair de lá, sacudi o pó dos vossos pés como testemunho contra eles». 12Os
Apóstolos partiram e pregaram o arrependimento, 13expulsaram muitos demónios,
ungiram com óleo muitos doentes e curaram-nos.
Esta missão
dos 12 é restrita aos judeus e vai ser uma espécie de estágio ou treino para a
missão universal, após a Ressurreição (cf. Mc 16, 15). Entre as recomendações
de Jesus sobressai a do desprendimento; com efeito, o pregador há-de pregar
sobretudo com o exemplo da sua vida.
11 «Sacudi o
pó…» Gesto habitual dos judeus ao entrarem na Terra Santa, para não a
contaminarem com a terra dos gentios, que se tenha colado às sandálias. Com tal
gesto mostrava-se que consideravam como gentios aqueles que os não recebessem.
13 «Ungiam com
óleo numerosos doentes». Aqui aparece insinuado o Sacramento da Unção dos
Enfermos, que o Senhor terá instituído talvez mais adiante e que mais tarde foi
recomendado e promulgado aos fiéis. na epístola de S. Tiago 5, 14 ss.
Sugestões para
a homilia
Servidores do
Reino
As instruções
dadas por Jesus aos apóstolos enviados em missão visavam ajudá-los a não perder
de vista a perspectiva de serviço ao Reino. O sucesso poderia fazê-los esquecer
sua condição de servidores e levá-los a cair na tentação de recrutar discípulos
para si mesmos. O insucesso poderia desanimá-los e levá-los a abandonar a
tarefa recebida. Tanto numa quanto na outra situação, o apóstolo deve manter-se
no caminho pelo qual enveredou.
A orientação
para missionar na pobreza visava evitar, por parte dos apóstolos, qualquer
espécie de exibição de poder, que atraísse multidões por motivos alheios ao
Reino. E, pior ainda, que inculcasse nelas o ideal de acumular bens,
despertando, em seus corações, falsas esperanças. A própria pobreza material
dos apóstolos já seria um instrumento de evangelização. Indicava uma
dependência radical a Deus. Tornava-se apelo para a partilha, por parte dos
ouvintes. Enfim, permitia aos apóstolos pregar com toda liberdade, pois nada
tinham a perder.
Eles foram
orientados também sobre como comportar-se no fracasso. Na medida em que tinham
consciência de terem sido fiéis no cumprimento da missão, caso os ouvintes não
dessem ouvido às suas palavras, só lhes restaria seguir adiante. A rejeição não
era um sinal de que a missão tivesse chegado ao fim. Restava-lhes o mundo todo
para evangelizar.
Que a Virgem
Maria faça de cada um de nós apóstolos felizes e testemunhas credíveis da
Palavra de seu Filho.
LITURGIA
EUCARÍSTICA
ORAÇÃO SOBRE
AS OBLATAS: Olhai, Senhor, para os dons da vossa Igreja em oração e concedei
aos fiéis que os vão receber a graça de crescerem na santidade. Por Nosso
Senhor.
SANTO: «DA
MISSA DE FESTA», Az. Oliveira, NRMS 50-51
Monição da
Comunhão
Ninguém dá o
que não tem. Só poderemos ser verdadeiros profetas e anunciadores de Cristo, se
estivermos intimamente unidos à sua Palavra e à sua Pessoa. Que a participação
na mesa da Eucaristia nos leve a transmitir com verdade e júbilo aquilo que
vimos, ouvimos e vivemos.
Salmo 83, 4-5
ANTÍFONA DA
COMUNHÃO: As aves do céu encontram abrigo e as andorinhas um ninho para os seus
filhos, junto dos vossos altares, Senhor dos Exércitos, meu Rei e meu Deus.
Felizes os que moram em vossa casa e a toda a hora cantam os vossos louvores.
Ou
Jo 6, 57
Quem come a
minha Carne e bebe o meu Sangue permanece em Mim e Eu nele, diz o Senhor.
ORAÇÃO DEPOIS
DA COMUNHÃO: Senhor, que nos alimentais à vossa mesa santa, humildemente Vos
suplicamos: sempre que celebramos estes mistérios, aumentai em nós os frutos da
salvação. Por Nosso Senhor.
RITOS FINAIS
Monição final
Ao longo de
sua vida, Jesus se dedicou à insistência e à prioridade do anúncio do Reino; o
Reino foi o tema prioritário, o fundamental na sua vida, a sua causa e utopia.
A profecia na Igreja não provém de vozes misteriosas interiores que possam
escutar só alguns espíritos privilegiados, mas sim da confrontação do cristão com
a utopia do Reino. Como profetas do novo Reino, partamos com a coragem de
anunciar e viver com alegria e coerência os valores do Evangelho.
Roteiro Homilético 7: Exegese
(http://www.presbiteros.com.br/)
EPÍSTOLA
EFÉSIOS 1,
3-10
(Pe. Ignácio,
dos padres escolápios)
INTRODUÇÃO:
Todos os nossos privilégios e toda a bondade de Deus, derramada em nós como
fruto de seu amor, têm como base e fundamento o amor do Pai por seu Filho
Jesus, o Verbo Encarnado, de cuja semelhança nós participamos como parte do
gênero humano, e de cuja inserção na divindade somos também porção pela imersão
no batismo, que nos torna membros da família divina. Daí que Deus nos escolheu
desde o início para sermos seus filhos, recapitulando em Cristo toda a obra de
sua criação, que agora se tornou redenção e será, em definitivo, glorificação.
DEUS BENDITO:
Bendito [eulogetos<2128>] o Deus e Pai do nosso Senhor Jesus Cristo quem
nos há abençoado em toda bênção espiritual nos espaços celestes [epouraniois
<2032>] em Cristo (3). Benedictus
Deus et Pater Domini nostri Iesu Christi qui benedixit nos in omni benedictione
spiritali in caelestibus in Christo. BENDITO: Eulogeö é a palavra
própria para abençoar em nome de Deus ou louvar seus benefícios como no caso do
pão que vamos comer (Mt 4, 19) ou no caso de pessoas que são abençoadas por
Deus (Mt 21, 9). Especificamente é a palavra usada para narrar a bênção do pão
eucarístico na última ceia (Mt 26, 26; Mc 14, 22 e Lc 14, 30). Até tal ponto
que Paulo chama o cálice consagrado de cálice da bênção (1 Cor 19, 6).
Eulogetos [bendito] é usado só para Deus e eulogemenos [abençoado] para o homem
que recebe os benefícios de Deus. Assim Maria é eulogemene (Lc 1, 42). Mas esta
não é única vez em que Paulo
se dirige a Deus com essa fórmula tão latrêutica e elegante. No NT a vemos
repetida em 2 Cor 1, 3 e 1 Pd 1, 3. É uma fórmula que provém do AT como lemos
em Gn 9, 26, Êx 18, 10 e Sl 28, 6 entre outras muitas passagens em que Deus é louvado. O
eulogetos corresponde ao baruk hebraico. Eulogomenos diferencia-se de Makairos
[ditoso], como bendito diverge de bemaventurado. Deus é bendito para sempre (Sl
72, 19), pois dEle só podemos receber o bem. PAI: O título indica o motivo ou a
pessoa da bênção. Nesse caso, ambas as coisas estão unidas: é o Pai de nosso
Senhor Jesus Cristo, que é bendito para sempre e a quem Paulo aclama como digno
de ser louvado. Precisamente ao chamar Jesus como Cristo [Messias] e como
Senhor [Kyrios<2962>] Paulo especifica uma paternidade que não é
compartida pelos fiéis. É a paternidade essencial e natural que transforma
Jesus em sagrado [ágios], como o chamou Gabriel ao explicar o mistério da
Encarnação; e consequentemente será Filho do Altíssimo (Lc 1, 35). EPOURANIOIS:
Literalmente significa sobre os céus, que o latim traduz como caelestis e que,
não tendo uma palavra própria devemos traduzir de modo intelectual como regiões
ou espaços celestes. O plural céus, é mais próprio da concepção semítica que,
como mínimo, acreditava em três céus (2 Cor 12, 2) em cujas regiões Deus
reinava supremo e não existia mal, nem maldade. A bondade divina se manifestava
em bens que Paulo aqui denomina como espirituais; pois o corpo não podia morar
em semelhantes lugares. E a causa dos benefícios é precisamente Cristo, ou
seja, o Jesus já constituído em Messias que nos libertou, por meio do resgate
de seu sangue, do pecado e da escravidão de Satanás.
CAUSA FORMAL:
De acordo como nos escolheu [exelexanto<1586>] nEle antes da fundação
[katabolës <2602>] do mundo para sermos consagrados [agious,40>] e sem
culpa [amömous <299>] perante Ele em amor. Sicut elegit nos in ipso ante mundi constitutionem
ut essemus sancti et inmaculati in conspectu eius in caritate. ESCOLHEU:
do verbo eklegomai selecionar, escolher. A escolha foi através de Jesus [nEle] pois
o nome correspondente a esse Ele é Cristo, em que foram dadas as mercês segundo
o versículo anterior. E a escolha foi feita antes da fundação [kataboles] do
mundo [kosmos]. KATABOLES: Segundo Mt 25, 34, o Reino definitivo foi preparado
pelo Pai desde a fundação do mundo. A escolha foi feita nesse lugar feliz em
que o Filho estava na glória do Pai, precisamente antes da fundação do mundo
(Jo 17, 24). KOSMOS: primariamente significa um conjunto ordenado, mas logo se
tornou sinônimo do Universo, o conjunto das coisas materiais que contemplamos
como espaço e ambiente que nos rodeiam. ÁGIOS: A palavra significa consagrado a
uma divindade, daí sagrado e finalmente santo, no sentido de não ser um ser
puramente humano [psikikos de Paulo], mas transcendente ou divino. Pelo batismo
fomos consagrados e imersos na família divina como membros da casa de Deus (Ef
2, 19). Daí que, inclusive a parte mais material, o corpo esteja também
consagrado e dedicado, como um templo a Deus (Rm 12, 1). SEM CULPA: Paulo fala
evidentemente da última realização do Reino em que tudo estará purificado, como
é vista essa Igreja ou Comunidade purificada por Cristo (Ef 5, 27) e que
completa seu corpo como pleroma (Ef 4, 12 e 1 Cor 12, 27), perante Ele. Isto
implica uma ordem previamente estabelecida por Deus: uma eleição que
corresponde, por nossa parte, a uma vocação, tendência e objetivo de nossas
vidas. Uma justificação que se dá no Batismo inicialmente; e, finalmente, a
glorificação que só se inicia, como em Cristo, quando, na hora da morte,
entregamos a vida em suas [do Pai] mãos. Agioi e imaculados são dois adjetivos
que representam as duas faces de uma pessoa purificada dos pecados: a positiva
como sagrada e a negativa como livre de culpa. PERANTE ELE: Deus é o santo por
excelência, como podemos ver em Santo, Santo, Santo é o Senhor (Is 6, 3) que em
termos semíticos significa o superlativo máximo, ou seja, Santíssimo. Por isso,
Ele não admite qualquer mácula ou imperfeição, especialmente a moral. Os
animais destinados ao sacrifício deviam ser perfeitos, assim como o pão
escolhido da flor da farinha. Sem essa total limpeza que os fariseus pensavam
ser externa, mas que Jesus ensinou como provindo do coração ou mente, não é
possível ver a Deus (Mt 5, 8). O homem deve permanecer descalço como mandou a
Moisés se apresentar para ter a permissão de estar no lugar santo (Êx 3, 5).
Descalço, como convém a um escravo, mas também com o significado de estar sem
as impurezas que as sandálias recolhem do caminho (Mt 10, 14). EM AMOR: Paulo
que fundamenta a justificação na graça de Deus, correspondendo a ela a fé do
homem, não o santifica a não ser pelo amor, resumido em sacrifício e
obediência. Há três maneiras de interpretar esse amor final do versículo 4: 1)
Escolhidos por amor, unindo como final ao início da frase. 2) A santidade como
fé aperfeiçoada pelo amor (Gl 5, 6) e que, na era escatológica, só permanecerá
como amor (1 Cor 3, 13). 3) Finalmente, a que os autores modernos preferem:
unida ao início do versículo seguinte: Em amor tendo nos predestinado.
A
PREDESTINAÇÃO: Tendo nos predestinado [proorisas<4309] para adoção filial
[uithosian <5206] através de Jesus Cristo para Ele, segundo o bem querer
[eudokian <2107>] de sua vontade [thelëmatos <2307>] (5). Qui
praedestinavit nos in adoptionem filiorum per Iesum Christum in ipsum secundum
propositum voluntatis suae. PREDESTINADOS: Paulo deixa praticamente toda a
pequena e grande história humana nas mãos do Pai. É com e por sua benevolência
que nós vivemos e somos, como disse aos atenienses (At 17, 28). Aparentemente
parece que a liberdade humana está fora de questão. Porém, esta é patrimônio
pessoal de todo ser humano e, infelizmente, temos a escolha de podermos
enfrentar os desígnios divinos que deveriam se cumprir universalmente em cada
um de nós, como Paulo descreve neste versículo. ADOÇÃO: a palavra grega é um
composto de uiós [filho] e tithemi [estabelecer] que, logicamente, significa
adoção de um filho. Feita por Deus como Pai, é muito mais efetiva que legal.
Implica uma participação na divindade, semelhante à que teve Jesus, com uma
relação de amor principalmente e com um efeito que os antigos padres da Igreja
exemplificavam com o fogo adquirido pelo metal nele submerso. Na realidade, o
batismo implica essa submersão que nos dá o elemento divino a produzir
semelhança e participação, introduzindo-nos na família divina como filhos
amados do Pai (Rm 8, 15) e como irmãos queridos de Jesus, unidos no amor do
Espírito. Esta adoção foi fruto do sacrifício de Jesus Cristo como causa
meritória, e a Ele unidos como causa exemplar cuja vida procuramos imitar em
obediência e com Ele unidos efetivamente por meio do Espírito que nos comunica
eficazmente ao tornarmos membros de seu corpo pleno como pleroma de seu
abundante poderio universal (Ef 1, 23). Porém não é em Jesus, o Cristo, que
tudo tem fim e sentido, mas é no Pai [para Ele] que as coisas são ordenadas,
como diz Paulo, uma vez que tudo esteja unido em Cristo, para assim apresentar
ao Pai o Reino, dessa forma conquistado (1 Cor 15, 24). EUDOKIA: Desejo, satisfação,
boa vontade, boa intenção, bel querer, ou bem querer. O Pai e Deus de nosso
Senhor Jesus Cristo (Rm 15, 6) quis ter mais filhos além do seu unigênito
encarnado; e sua vontade admite como tais os que se conformam ao seu Unigênito
como diz o apóstolo em Rm 8, 29: Aqueles que de antemão conheceu, também os
predestinou a serem conformes à imagem do seu Filho. Este é, segundo Paulo, o
modelo e origem de toda a nova humanidade; pois Ele é o primeiro dos nascidos
entre muitos irmãos (idem). Assombra essa unidade de doutrina coerente nas
cartas paulinas, que não vemos ter muita base nos evangelhos. À exceção do 4º
evangelista, os outros têm aparentemente uma teologia muito mais simples, com
base na basileia, e da qual dificilmente poderíamos extrair estas conclusões
teológicas paulinas. Quem foi primeiramente escrito, Paulo ou o evangelista
(Marcos, Mateus, Lucas e João)? É uma questão que praticamente não se discute,
mas que é digna de grave consideração.
FINALIDADE:
Para exaltação [epainon<1868>] de glória [doxës<1391>] da sua
caridade [charitos<5485>] na qual nos favoreceu [echarisomen
<5487>] no Amado [ëgapëmeno <25>] (6) em quem temos o resgate
[apolutrösin <629>] pelo seu sangue, a remissão [afesin <659>] dos
pecados [paraptömatön <3900>], segundo a riqueza [ploutos <4149>]
de seu amor [charitos <485>] (7). In laudem gloriae gratiae suae in qua
gratificavit nos in dilecto, in quo habemus redemptionem per sanguinem eius
remissionem peccatorum secundum divitias gratiae eius. EPAINOS: louvor, elogio,
panegírico. É a glorificação da DOXA, que significa, em sentido religioso, a
magnificência de Deus como supremo Senhor e do Messias como rei absoluto do
Universo. Também se pode falar da gloriosa condição com a qual Deus, o Pai,
exaltou o Filho após seu sacrifício na cruz. E finalmente a condição gloriosa
dos bemaventurados como participantes da glória de seu Senhor. A frase para o
louvor de sua glória, ou da glória de sua graça, sai 3 vezes nesta epístola
(1,6; 1, 12 e 1, 14). E Deus recebe o titulo de Pai da glória (1, 17); glória
que deve ser participada como é a paternidade, formando a parte dada ao filho
em herança (1, 18). CARIDADE: Assim temos traduzido a charis grega que
significa favor, dádiva, mercê. Por parte de Deus, de modo especial, é o dom de
si mesmo no Espírito Santo (Lc 11, 13) que nos é dado (Jo 14, 26) como
continuação do dom do Filho (Jo, 3, 16). AMADO: É o particípio passivo perfeito
do verbo agapaö que significa amar, que o latim traduz por dilectus.
Evidentemente, o Amado é Jesus de Nazaret, segundo vemos em Mt 3, 17 em que Jesus recebe o
título de agapetós desta vez adjetivo que substitui o nome como aposição.
APOLYTRÖSIS: É um homônimo de Lytron e ambos significam resgate, ou seja, o
pagamento a satisfazer para alforriar um escravo. O pagamento, no caso, foi o
sangue, isto é, a vida sacrificada pelos homens, todos pecadores, considerados
escravos do diabo e do pecado. Daí que a remissão seja do pecado. E tudo foi
feito devido à riqueza de seu amor. PARAPTÖMATOS: propriamente transgressão,
como vemos em Mt 6, 5; é a palavra que Paulo emprega 14 vezes em suas cartas. O
significado é uma injúria ou afronta contra uma pessoa, seja Deus ou o próximo.
Pode ser substituído por pecado ou delito. PLOUTOS: pode significar a
abundancia, ou seja, a grandeza sem limites de seu amor. Paulo é um enamorado
do amor de Cristo por ele e por todos os que nEle confiam.
A ABUNDÂNCIA:
A qual excedeu em nós em toda sabedoria [sofia<4678>] e discernimento
[fronësei<4528>] (8). Quae superabundavit in nobis in omni sapientia et
prudential. A tradução mais exata, do ponto de vista mais inteligível, seria:
Essa opulência de seu amor excedeu, com respeito a todos nós, tudo o que
podemos pensar e é prudente imaginar. SOFIA: Embora seja um saber prudente,
aqui parece ter o significado de conhecimento em todos os amplos limites da
palavra. FRONESIS: Pensamento, que pode ser atitude, como em Lc 1, 17 ou
discernimento como um conhecer, na sua totalidade, circunstâncias e fatos. O
sentido é um superlativo absoluto desse amor divino que é impossível imaginar,
dentro dos limites de nosso modo de pensar e atuar.
A POLÍTICA
DIVINA: Para a administração [oikonomian<3622>] da complementação
[plërömatos <4138>] dos tempos: resumir [anakefalaiösasthai <346>]
todas as coisas no Cristo, tanto as dos céus como as que estão sobre a terra
(10). In dispensationem
plenitudinis temporum instaurare omnia in Christo quae in caelis et quae in
terra sunt in ipso. ADMINISTRAÇÃO: oikonomia é a gerência dos bens
domésticos que, em termos mais amplos, podemos falar de administração de uma
empresa ou negócio. Aqui se trata do assunto da salvação dos homens. PLERÖMA: E
estamos já no final dos tempos que Paulo fala do fim, ou do remate dos mesmos.
Propriamente é a conclusão de um período. É a escatologia [o fim de uma era]
que já está em função e atuando do momento em que o Verbo se encarnou, segundo
Tt 1, 3, que são os tempos próprios para se manifestar essa sua bondade e
benignidade (Tt 3, 4). E precisamente essa sua manifestação tem como base a de
resumir, como num compêndio de sua política, todas as coisas tanto nos céus
como na terra. Exclui Paulo os infernos, lugar onde estão os poderes do mal?
Aparentemente não; mas sabemos por outros escritos que os demônios creem e
temem (Tg 2, 19), embora estejam submetidos e tenham que dobrar, como vencidos,
o joelho diante do nome de Jesus (Fl 2, 10), que os fiéis dobram como amigos.
De modo que Cristo seja tudo em todos (Ef 1, 23 e Cl 3,11).
PREDESTINADOS:
Nele, no qual também fomos chamados predestinados segundo o propósito daquele
que todas as coisas opera segundo o desígnio de sua vontade (11). In quo etiam
sorte vocati sumus praedestinati secundum propositum eius qui omnia operatur
secundum consilium voluntatis suae. FOMOS CHAMADOS [eklëröthëmen<2820>=vocati
sumus] é o aoristo passivo de indicativo do verbo klëroö de significado ser
designado por sorte. Logicamente aqui a sorte é substituída pelos desígnios da
providência. Chamados por vocação de Deus, como foram os convidados na segunda
chamada ao banquete das bodas reais (Mt 22, 9). PREDESTINADOS [prooristhentes
<4309>=praedestinati] particípio do aoristo passivo do verbo proorizö,
com o significado de predestinar, como lemos em At 4, 28: Para fazerem tudo o
que a tua mão e o teu conselho tinham anteriormente determinado que se houvesse
de fazer. PROPÓSITO [prothesis<4286>=propositum] apresentação, como eram
os pães da proposição (Mt 12, 4); e em termos formais, plano, propósito,
resolução, vontade (At 11, 23). E é neste sentido que temos escolhido a tradução.
DESÍGNIO [boulë <1012>=consilium] plano, propósito, resolução, e decisão
como em At 2, 23: Jesus foi entregue conforme o plano previsto na sabedoria de
Deus. Ou conselho e deliberação como em At 4, 23: Dai de mão a estes homens, e
deixai-os, porque, se este conselho ou esta obra é de homens, se desfará. A
tradução desígnio é até conforme com a ideia paulina que coloca a predestinação
e vontade divina acima de nossos próprios méritos. É o que Paulo dirá como base
de sua gratitude: O qual me amou, e se entregou a si mesmo por mim (Ef 1, 5).
PARA LOUVOR:
Para sermos para louvor de sua glória os que previamente temos esperado em
Cristo (12). Ut simus in
laudem gloriae eius qui ante speravimus in Christo. LOUVOR
[epainos<1868>=laus] aprovação, reconhecimento. O exemplo é Rm 1, 29: A
circuncisão, a que é do coração, no espírito, não na letra; cujo louvor não
provém dos homens, mas de Deus. Como aprovação temos 1 Cor 4, 5: [no dia do
juízo] então cada um receberá a devida aprovação da parte de Deus. Por isso, Paulo
dirá que nos predestinou para filhos de adoção por Jesus Cristo, para louvor e
glória da sua graça, pela qual nos fez agradáveis a si no Amado (Ef 1, 5-6).
Evidentemente Paulo está falando do final dos tempos escatológicos em que a
bondade será suprema e o louvor terá como motivo uma ação de graças perene por
termos recebido de Cristo a nova vida que nos tornou filhos no Filho (Gl 4,
20).
SELADOS: No
qual também vós, ouvintes da palavra da verdade, o evangelho de vossa salvação,
no qual também fostes selados com o Espírito Santo da promessa (13). In quo et
vos cum audissetis verbum veritatis evangelium salutis vestrae in quo et
credentes signati estis Spiritu promissionis Sancto. Paulo chama de palavra da
verdade o evangelho que é salvação. FOSTES SELADOS
[esfragisthëte<4972>=signati estis] é o aoristo passivo do vebo sfragizö
literalmente coisa que está provista de um carimbo, ou selada, como diz Mateus
27, 66 do sepulcro: seguraram o sepulcro com a guarda, selando a pedra. Em
sentido figurado, marcado com uma identidade especial, como aqui e em 2 Cor 1,
22: O qual também nos selou e deu o penhor do Espírito em nossos corações. A
identidade do selo é o Espírito que em nós habita e clama Abbá (Rm 8, 15). Esse
Espírito é o da PROMESSA [epaggelia<1860>=promisio] ou Espírito
prometido, como paraklëtos, que Jesus tinha prometido: Eu rogarei ao Pai, e ele
vos dará outro Paráclito, para que fique convosco para sempre (Jo 14,16). Para
ser o Espírito da Verdade e a Testemunha essencial de Cristo (Jo 14,13 e 16, 8-10).
O PENHOR: O
qual é penhor de nossa herança para resgate de sua posse para louvor de sua
glória (14). Qui est pignus
hereditatis nostrae in redemptionem adquisitionis in laudem gloriae ipsius. PENHOR
[arrabön<728>=pignus] com o signficado de depósito, pagamento inicial,
fiança, penhor, garantia. De que é o Espírito garantia? Como Paulo afirma,
pouco antes de falar do penhor do Espírito, sua garantia de que o mortal seja
absorvido pela vida (2 Cor 5,4). HERANÇA [klëronomia<2817>=hereditas]
como em Mt 21, 38: Os lavradores, vendo o filho, disseram entre si: Este é o
herdeiro; vinde, matemo-lo, e apoderemo-nos da sua vinha. Segundo a lei
vigente, ao não ter herdeiros o dono, a herança seria dos vinhateiros
trabalhadores. A herança é eterna segundo Hb 9, 15, incorruptível e
incontaminável, como é o reino de Cristo definitivo. Se a herança do AT era uma
terra prometida, a Eretz Israel, a herança do NT era a participação do Reino, a
eterna bem-aventurança de viver a mesma vida de Deus dentro de nós. Vive em mi Cristo , que diz Paulo
(Gl 2, 20). Por isso o Espírito que habita no fiel é o penhor e garantia de que
a vida definitiva nunca nele terá fim. RESGATE
[apolytrösis<629>=redemptio] o significado próprio era de pagamento para
a libertação de um escravo, que do latim redemptio, foi traduzido em línguas
vernáculas, como redenção. Exemplo: Quando estas coisas começarem a acontecer,
olhai para cima e levantai as vossas cabeças, porque a vossa redenção está
próxima (Lc 21, 28). Essa redenção, segundo Paulo, atinge o corpo tanto como o
espírito do homem; pois substancialmente é a adoção do mesmo como filho de Deus
já que esperamos a mesma por adoção como redenção do nosso corpo (Rm 8, 23). E
quem fez o pagamento foi Cristo em quem temos a redenção pelo seu sangue (Ef 1,
7). De modo que o cristão já é posse de Cristo; e, como diz Paulo, para louvor
de sua [de Cristo] glória. De modo que tudo é de Cristo (Cl 3, 11) e Cristo é
de Deus (1Cor 15, 24).
EVANGELHO
XV DOMINGO DO
TEMPO COMUM
Marcos 6, 7-13
(paralelos: Mt
10, 1-42 e Lc 9, 1-10)
(Pe. Ignácio,
dos Padres escolápios)
INTRODUÇÃO: O
evangelho é a narração do envio dos 12, na sua missão de anunciar o Reino com
missão limitada à região da Palestina (Mt 10, 5), com ênfase especial na
conversão, porque o Reino já chegou (Mt 10, 7). O Reino implicava uma nova
mentalidade, um giro de 180 graus de uma religião externa e formalista, com
base na Torah, a outra em que o encontro com Jesus, um enviado do Pai, era o
fundamento de uma fé que se exercitava pelo amor (Gl 5, 6). Embora possamos
afirmar que nem mesmo os doze entendiam totalmente a base do Reino, a exceção
de que Jesus era o Messias, o iniciador de uma nova Era ou pacto com Deus, de
um povo novamente eleito (Jo 1, 49). O relato de Marcos é o mais breve dos três
sinóticos e apenas contém doutrina teológica e uma série de recomendações
práticas para distinguir os verdadeiros missionários dos astutos arrecadadores
de riquezas, para proveito individual. Vejamos a interpretação dos versículos
que o compõem.
A MISSÃO:
Então, chama a si [proskaleitai <4341>] os doze e começou a enviá-los
dois a dois, e deu-lhes autoridade [exousian <1849>] sobre os espíritos
[pneumatön<4151>], os impuros [akathartön <169>] (7). Et convocavit
duodecim et coepit eos mittere binos et dabat illis potestatem spirituum
inmundorum. CONVOCA: Mateus usa o mesmo verbo, só que, mais corretamente, no
aoristo e não no presente de Marcos. Os convoca, aos doze. Quando foi esta
missão? Muito provavelmente após um tempo longo de convivência com Jesus. Um
ano após tê-los chamado como seus discípulos, talvez. Um mestre esperava um
tempo suficientemente longo para poder confiar que seus ensinamentos estivessem
bem fundados para seus discípulos poderem repetir quase ao pé da letra os seus
ensinamentos. Isto avalia os escritos evangélicos, se realmente escritos pelos
apóstolos ou com sua licença. Os escritos são produto de um discipulado
constante e repetido. A eleição de Matias corrobora este modo de julgar: homens
que acompanharam Jesus desde o batismo (At 1, 21-22). Um dado a mais: as frases
curtas do Senhor são, segundo os expertos, verdadeiros dísticos, como
acostumavam ser os pronunciamentos dos rabinos. Nem tudo é devido à memória dos
semitas, nem tudo é uma recordação afastada no tempo. O ENVIO: Foi feito de
dois em dois, para ajuda mútua e para que ninguém pudesse duvidar de suas
asserções, pois a Lei mandava que fossem duas as testemunhas (Dt 17, 6 e 19,
15). AUTORIDADE: Exousia que entre suas acepções está o poder de governar e
mandar, de modo que os súditos fossem obrigados a obedecer. Tal era o poder
dado por Jesus aos doze sobre os demônios, poder muito mais admirado, na época,
que o de curar doenças, e muito mais ordenado à implantação do Reino, cujo
inimigo era, evidentemente, o Maligno, ou Satanás (Mt 13, 25). ESPÍRITOS
IMPUROS: Pneuma entre outros significados tem o de ser um espírito superior ao
homem, mas inferior a Deus, que pode ser um anjo; mas que neste caso é um
demônio ou espírito imundo [akathartos]. Esses demônios impuros eram, segundo
se acreditava, a origem das doenças nervosas e doenças do tipo possessão
diabólica, que tomavam posse do corpo do possesso. A frase espírito imundo sai
1 vez em Mateus (12, 43), 7 em Marcos e 4 em Lucas. Como
endemoninhado temos 2 em Mateus, 4 em Marcos e 2 em Lucas. É notável que em
João não tenhamos nenhum caso de cura de um possesso, mas é o próprio Jesus a
quem os seus contemporâneos dizem ter demônio (Jo 7, 29; e 8, 48 entre outros).
Hoje diríamos que está louco, como vemos em Jo 10, 20. Já que muitas doenças
das que hoje sabemos têm sua origem puramente fisiológica, eram atribuídas a um
espírito maligno, como podemos ver nos casos de mudos e cegos (Mt 9, 32 e 12,
22). Logicamente vemos como os escritores sagrados falam segundo a ciência da
época e a cultura correspondente, tanto histórica, como de origem mais ou menos
científica. Não podemos, pois, usar citações bíblicas para afirmar fatos
científicos ou históricos como verdades reveladas. Segundo Mateus, os apóstolos
também receberam o carisma de cura para toda classe de doenças e enfermidades
(Mt 10, 1), coisa que Lucas confirma (Lc 9, 1).
AS ORDENS: E
lhes ordenou que nada tomassem para (o) caminho, senão um bastão
[rabdon<4464>] só, nem alforje [përan<4082>], nem pão, nem cobre
[chalcon<5475>] no cinto [zönën<2223>] (8), mas, tendo calçado
sandálias [sandália <4547>]; e não vistais duas túnicas [chitönas] (9).
Et praecepit eis ne quid tollerent in via nisi virgam tantum non peram non
panem neque in zona aes. Sed calciatos sandaliis et ne induerentur duabus
tunicis. BASTÃO: A palavra indica um bordão, uma vara grossa que era a arma com
a qual os peregrinos se defendiam dos bandidos no caminho. Mas tudo que não é
imediatamente necessário para o caminho deve ser eliminado: alforjes [përa]
onde levar a comida como o pão, ou onde os mendicantes religiosos ou os famosos
cínicos da época, levavam os dinheiros arrecadados em suas viagens
missionárias. Fora desse cajado, necessário para o caminho, a proibição de
qualquer outra ajuda ou provisão é clara nas ordenanças de Jesus. Nada de
comida e nada de dinheiro para comprá-la ou se hospedar nos povoados. Com
respeito ao dinheiro, Marcos fala de cobre [chalcon] no cinto. No Brasil, até
pouco tempo atrás, o dinheiro que em castelhano eles chamam de prata, era em
português denominado como cobre. Exatamente como em Marcos. Cobre está
por moedas de qualquer metal que eram colocadas no cinto [zönë], propriamente
uma faixa de tela que, como era oca, servia de bolsa para carregar o dinheiro.
Jesus permite o uso de sandálias: uma sola de couro atada ao pé por meio de
tiras da mesma matéria. Era o calçado para o caminho, já que, em geral, em casa
andavam com os pés nus. As duas túnicas: A palavra Chitön era a túnica ou
vestido interior diferente da clâmide ou capa, externa. Que podemos dizer sobre
estas recomendações? Jesus quer evitar a simonia. Na época, existiam muitos
mensageiros ambulantes que em nome de um templo ou uma divindade percorriam os
caminhos e entravam nas cidades. Saiam em busca de dinheiro para seus templos e
voltavam carregados de bens. Temos o exemplo de Lucino que, como ministro da
deusa Atargatis, reunia donativos para os sacrifícios de seu santuário. Saiu
como mendigo, mas voltou como um arrieiro carregado de mercadorias. Em cada
viagem trazia setenta sacos cheios. Talvez o exemplo dos apóstolos missionários
dos tempos da Didaché tenha sido tomado deste trecho evangélico: não deve
permanecer mais de um dia ou dois… Se permanecer 3 dias é um falso profeta. E
quando partir, que não tome nada a não ser pão e se pede dinheiro é um falso
profeta.
HOSPEDAGEM: E
dizia-lhes: quando, pois, entrardes em casa, permanecei ali até dali sairdes
(10). Et dicebat eis quocumque introieritis in domum illic manete donec exeatis
inde. Em Mateus temos uma explicação mais explícita desta hospedagem buscando
uma casa digna, isto é que não fosse impura por diversas circunstâncias. A
razão de não mudar de casa é melhor compreendida nestas palavras de um rabino
da época: Até quando um homem não deve mudar de hospedagem gratuita? E o rabi
respondeu: Até que o hospedeiro não o golpeie ou lhe jogue suas coisas nas
costas. Como temos visto, a Didaché não permitia uma estadia muito prolongada.
A REJEIÇÃO: E
se em algum lugar não vos receberem nem vos ouvirem, saídos dali, sacudi o pó
dos calçados de vossos pés em testemunho para eles (11). Et quicumque non
receperint vos nec audierint vos exeuntes inde excutite pulverem de pedibus
vestris in testimonium illis. Nas ideias da época, se alguém vinha de viagem de
regiões de gentios e não se purificava ao entrar em Israel, a profanava com o
pó que trazia dessas regiões. Por isso estava obrigado a sacudir vestidos e
calçados antes de entrar no Hertz Haaretz [terra de Israel]. Esse gesto foi
feito por Paulo e Barnabé em Antioquia da Pisídia, quando os judeus levantaram
uma perseguição contra eles (At 13, 51). Mais do que o gesto está a condenação
dos que não quiseram ver a luz nem ouvir a verdade testemunhada com prodígios,
como eram os sinais feitos pelos apóstolos.
RESULTADOS: E
tendo saído, pregavam para que se convertessem [metanoësösin <3340>]
(12). E expulsavam muitos demônios e ungiam com óleo muitos doentes e sanavam
(13). Et exeuntes praedicabant ut paenitentiam agerent. Et daemonia multa
eiciebant et unguebant oleo multos aegrotos et sanabant. O metanoeö significa
mudar de parecer, ou seja, admitir que até agora não se tinha seguido uma
religião correta e se devia em consequência mudar de ideias e conduta. Era uma
forma nova de culto a um Deus que rejeitava a antiga adoração como defeituosa e
insuficiente. Além de que por meio dos antigos profetas, cuja tradição vemos
refletida nas palavras do Batista, essa nova presença de Deus era como um
julgamento em que palha e trigo deviam ser separados (Lc 3, 17). A unção com
óleo é uma forma de remédio muito usada nos tempos antigos. Sua prática no
Oriente é usual até em nossos dias, mas o uso pelos apóstolos, nesta ocasião, é
mais instrumental que curativa. Era um sinal externo de que pela fé o poder
divino atuava no enfermo para obter a cura. Todos se curavam? Não existe
certeza, embora a frase deixe margem suficiente para pensar numa cura geral.
Era o sacramento da Unção? Não, pois neste a finalidade principal era
taumatúrgica e na unção temos o perdão dos pecados e da culpa dos mesmos como
finalidade primária. O Concílio de Trento afirma: A unção sagrada dos enfermos
foi instituída como verdadeiro e próprio sacramento do NT por Cristo, Nosso
Senhor, insinuado já em Marcos e promulgado por Tiago (Tg 5, 14). Como temos
dito no início, a expulsão dos demônios era um símbolo especial: o de que uma
nova era já estava atuando e de que o poder do maligno estava sendo derrotado:
Se no dedo de Deus eu expulso os demônios, certamente a vós é chegado o Reino
de Deus (Lc 11, 20).
Roteiro Homilético 8: Mons. José Maria
(http://www.presbiteros.com.br/)
Quem é o
Padre?
“Em Cristo, o
Senhor nos escolheu, antes da fundação do mundo, para que sejamos santos e
irrepreensíveis sob o seu olhar, no amor” (Ef 1,4). Todos os batizados podem
aplicar a si próprios essas palavras de São Paulo. Graças ao Batismo e à Confirmação
(Crisma), todos os fiéis cristãos são “uma raça eleita, um sacerdócio real, uma
nação santa, o povo de sua particular propriedade” (1 Pd 2,9), “destinados a
oferecer vítimas que sejam agradáveis a Deus por Jesus Cristo” (Vat. II,
LG,10).
Por vontade
divina, dentre os fiéis que possuem o sacerdócio comum, alguns são chamados-
mediante o sacramento da Ordem- a exercer o sacerdócio ministerial. Este
pressupõe o sacerdócio comum dos fiéis, mas distingue-se dele essencialmente:
pela consagração recebida no sacramento da Ordem, o sacerdote converte-se em
instrumento de Jesus Cristo, a quem empresta todo o seu ser, para levar a todos
a graça da Redenção. É um homem escolhido entre os homens, constituído em favor
dos homens no que se refere a Deus, para oferecer dons e sacrifícios pelos
pecados (Hb 5,1). Qual é, pois, a identidade do sacerdote? “A de Cristo. Todos
os cristãos podem e devem ser não já alter Christus, mas ipse Christus: outros
Cristos, o próprio Cristo! Mas no sacerdote isto se dá imediatamente, de forma
sacramental” (S. Josemaria Escrivá, Amar a Igreja, pág. 72).
O Senhor,
presente de muitas maneiras entre nós, mostra-se muito próximo na figura do
sacerdote. Cada sacerdote é um imenso dom de Deus ao mundo; é Cristo que passa
fazendo o bem, curando doenças, dando paz e alegria às consciências; é o
instrumento vivo de Cristo no mundo, empresta a Nosso Senhor a sua voz, as
mãos, todo o seu ser. “Jesus – recordava Beato João Paulo II aos sacerdotes –
identifica- nos de tal modo consigo no exercício dos poderes que nos conferiu,
que a nossa personalidade como que desaparece diante da sua, já que é Ele quem
atua por meio de nós.”
Na celebração
da Missa, é Jesus Cristo quem muda a substância do pão e do vinho no seu Corpo
e no seu Sangue. E “é o próprio Jesus quem, no sacramento da Penitência,
pronuncia a palavra autorizada e paterna: Eu te absolvo dos teus pecados. E é
Ele quem fala quando o sacerdote, exercendo o seu ministério em nome e no
espírito da Igreja, anuncia a Palavra de Deus. É o próprio Cristo quem cuida
dos doentes, das crianças e dos pecadores, quando o amor e a solicitude
pastoral dos ministros sagrados os envolvem” (Beato João Paulo II).
Um sacerdote é
mais valioso para a humanidade que todos os bens materiais e humanos juntos.
Daí a importância de rezarmos muito pela santidade dos sacerdotes, ajudá-los e
ampará-los com a nossa oração e a nossa estima.
Deus toma
posse daquele que chamou ao sacerdócio, consagra-o para o serviço dos outros
homens, seus irmãos, e confere-lhe uma nova personalidade. E este homem, eleito
e consagrado ao serviço de Deus e dos outros, não o é somente em algumas
ocasiões determinadas, por exemplo, quando realiza uma função sagrada, mas
sempre, em todos os momentos, tanto quando exerce o mais alto e sublime ofício
como no ato mais vulgar e humilde da vida quotidiana. Qualquer coisa que faça,
qualquer atitude que tome, quer queira, quer não, será sempre a ação e a
atitude de um sacerdote, porque ele o é sempre, em todas as horas e até à raiz
do seu ser, faça o que quiser e pense o que pensar.
O Sacerdote é
um enviado de Deus ao mundo, para que lhe fale da sua salvação, e é constituído
administrador dos tesouros de Deus: o Corpo e o Sangue de Cristo, bem como a
graça de Deus por meio dos sacramentos, a palavra de Deus mediante a pregação,
a catequese ,os conselhos da Confissão. Está confiada ao sacerdote a mais
divina das obras divinas, que é a salvação das almas; foi constituído
embaixador e medianeiro entre Deus e os homens.
Por isso temos
que rezar muito mais para que a Igreja conte sempre com os sacerdotes
necessários, com sacerdotes que lutem por ser santos. Temos que rezar e
fomentar essas vocações, se é possível, entre os membros da própria família!
Que imensa alegria para uma família se Deus a abençoa com este dom!
Enviai,
Senhor, Apóstolos Santos à vossa Igreja.
Roteiro Homilético 8: Padre Françoá Costa
(http://www.presbiteros.com.br/)
Fidelidade a
Cristo
Eusébio, pai
de Constantino Magno, passava em revista os seus soldados. Parado no meio do
campo, exclamou: -“Os que forem cristãos venham para a minha direita”. Alguns
tremeram, pois sabiam que Eusébio era idólatra. Eusébio, por sua vez, sabia que
muitos dos seus soldados eram cristãos. Alguns valentes, com passo resoluto,
puseram-se à sua direita, exclamando: -“Nós somos cristãos!” O imperador olhou
para eles com fereza e disse: -“Sois vós somente?” Nenhum outro se moveu do
lugar. Então dirigindo-se aos que estavam à sua direita, disse Eusébio: -“Vós
formareis a minha legião de honra e todos os outros serão expulsos de minhas
fileiras, porque da mesma maneira com que hoje se envergonharam de seu Deus
diante do imperador, amanhã terão vergonha do imperador diante do inimigo”. (P.
Francisco Alves, Tesouro de exemplos I, 380).
Como é
importante ser fiel a Deus! Nós, cristãos, também não desprezamos a lealdade à
palavra dada. Os cristãos são chamados de “fiéis”. Precisamos encorpar cada vez
mais esse nome: fiel de Cristo. Fiéis! Leais!
Amós e Amasias
são duas figuras muito interessantes. Amós foi um profeta que exerceu a sua
missão no Reino do Norte. Lembrem-se: com Davi, unificam-se todas as tribos;
Salomão, seu filho, continua a governar o reino unido; após a morte de Salomão
tem lugar a divisão, formando-se assim o Reino do Norte, cujo principal lugar
de culto era o Santuário de Betel, e o Reino do Sul, tendo Jerusalém e o seu
Templo, construído por Salomão, como o lugar por excelência do culto a Deus.
Amós recebe
uma missão divina, a de profetizar, que inclui o anúncio e a denúncia.
Encontramo-nos no reinado de Jeroboão II, no Reino do Norte, no século VIII
a.C. Os tempos de Jeroboão II são tempos de prosperidade e de esplendor
material, mas também de muitas injustiças: “o luxo dos grandes insulta a
miséria dos oprimidos, e na qual o esplendor do culto disfarça a ausência de
uma religião verdadeira”. Amós é um homem simples, e com essa simplicidade, com
as características próprias de um “homem da roça” começa a profetizar, a
denunciar as injustiças.
Amasias,
sacerdote do Santuário de Betel, homem profundamente zeloso de seus próprios
interesses e dos do rei fala ao profeta que se retire, sem dúvida em detrimento
da verdade. Amasias prefere continuar com aquele culto disfarçado e com os seus
interesses materiais a ouvir a Palavra do Senhor. As verdades “duras e cruas”
são sempre difíceis de serem acolhidas porque mexem com a nossa comodidade,
nosso orgulho e nosso egoísmo. Preferimos muitas vezes permanecer na mentira a
escutar a verdade de Deus… Por que? Porque incomodam. Tantas vezes privamos os
nossos irmãos de um grande bem como é a correção fraterna porque somos
covardes, falta-nos a valentia; ao invés de darmos ao nosso irmão essa grande
ajuda, o bajulamos e o adulemos fazendo com que permaneça nos seus defeitos e
nos seus pecados contanto que continuemos com os nossos benefícios.
Amós
apresenta-se como um homem valente, destemido. Ele sabe que tem uma missão
divina, e precisa cumpri-la ainda que muitos se sintam incomodados e ofendidos.
Também a Igreja tem uma mensagem divina, tem uma missão divina. Precisa
anunciá-la, não pode calar-se; ainda que muitos sintam-se contrariados, ela
precisa falar. Nós, filhos de Deus e de sua Igreja, não podemos ser transigentes
com a verdade, para nós dois mais três sempre serão cinco e não quatro e meio.
Precisamos ser fiéis à fé e à moral cristã, precisamos ser coerentes, viver
essa admirável unidade de vida que tem que caracterizar a vida da filha e do
filho de Deus. Os transigentes não são felizes, e não o são porque não são
fiéis. Fidelidade e felicidade são irmãs. “A transigência é sinal certo de não
se possuir a verdade. – Quando um homem transige em coisas de ideal, de honra
ou de Fé, esse homem é um homem… sem ideal, sem honra e sem Fé” (S. Josemaria
Escrivá, Caminho, 396).
Transigir é
ceder naquilo que não se deve ceder. Alguns exemplos:
Alguém diz:
“Jesus Cristo é um simples homem”. O cristão medroso responde: “sabe que você
tem razão.
Aquele amigo
da turminha diz: “a castidade, a pureza, é uma bobagem”. O jovem cristão, porém
transigente, responde: “realmente, a Igreja é uma antiquada”, no fundo ele não
acredita que seja assim, mas para ficar bem diante dos amigos…
Sei que a
justiça é um valor importante, mas… de vez em quando cobrar um “jurinho”, lá no
meu comércio, de 500% não tem problema… !?
Um conselho:
“Sê intransigente na doutrina e na conduta. – Mas suave na forma. – Maça
poderosa de aço, almofadada. – Sê intransigente, mas não sejas cabeçudo.”
(Caminho, 397). As coisas da fé e da moral são intocáveis. Os interesses de
Deus e de sua Igreja em primeiro lugar, não os nossos próprios interesses. De
que lado ficaremos, do lado de Amasias, com os nossos interesses, porém na
covardia e na submissão aos homens, ou na companhia dos corajosos e valentes
que, como Amós, anunciam a Verdade de Deus e denunciam a mentira e a falsidade,
a injustiça e demais desordens com a finalidade de promover o bem dos nossos
irmãos, os homens e as mulheres de hoje? Da nossa fidelidade dependem muitas
coisas. Se você quer ver o seu marido ou a sua esposa, o seu filho, a sua
filha, o seu amigo pertinho de Deus: isso depende de você também, da sua
fidelidade a Deus!
O Evangelho de
hoje nos fala da missão dos apóstolos: de pregar o Evangelho e fazer as obras
que Jesus fazia. Eles cumpriram com a sua missão, foram fiéis e… por isso
estamos aqui hoje louvando-o nessa liturgia dominical. A maior parte deles
foram mártires, derramaram o seu sangue pelo nome de Cristo, mas, como bem se
sabe, “o sangue dos mártires é semente de novos cristãos”.